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Revoltado com a pressão e as ameaças dos torcedores do Fluminense, o atacante Fred desabafou: "O torcedor pode cobrar. Mas dar porrada, quebrar carro, jogar pedra, não tem como aceitar esse tipo de situação. Vai precisar de quê? Morrer um como aconteceu na Argélia?"

O jogador tem toda a razão, mas comete um equívoco. Somente em 2014 já ocorreram duas mortes ligadas ao futebol no Brasil. Duas vítimas da ignorância que ronda o esporte por aqui.

Uma delas estava do lado de fora do Estádio do Arruda, no Recife, após a partida entre Santa Cruz e Paraná. Ricardo Gomes da Silva, 26 anos, foi atingido – pasmem – por um vaso sanitário arrancado de um dos banheiros e arremessado do alto do terceiro anel.

A outra vítima chamava-se Gilberto Torres Pereira, 31 anos. No dia 21 de agosto, ele foi espancado na cabeça com pedaços de madeira durante briga entre torcidas de Palmeiras e Corinthians em uma estação de trem em São Paulo. Não resistiu. Nesse conflito foi detido, entre os bárbaros, um vereador da cidade paulista de Francisco Morato, integrante da Gaviões da Fiel.

A revolta de Fred tem todo o cabimento, é legítima e necessária, mas soa como um desabafo em um momento em que atletas são intimidados. Se Fred acompanhasse o noticiário de futebol, saberia que a violência que ronda as torcidas já tirou duas vidas no Brasil neste ano. E que, de janeiro até agora, houve no mínimo uma dúzia de graves conflitos entre "torcedores". Câmeras registraram cenas bárbaras nas ruas de Santos e de Porto Alegre, antes das partidas entre Santos e Corinthians, e Grêmio e Internacional. Também em Curitiba, nos arredores do Couto Pereira, antes do jogo entre Coritiba e Corinthians. Ainda na capital paranaense, torcedores organizados do Coxa foram ao CT do clube "cobrar empenho" dos jogadores. Entre eles estava o principal envolvido no quebra-quebra de 2009, que levou o clube a cumprir uma longa punição no âmbito da Justiça Desportiva (hoje, o cidadão é presidente da torcida organizada alviverde).

Coincidentemente, dois clubes paranaenses pagaram um preço alto pela má conduta de seus torcedores. Pelos confrontos de 2009, no Alto da Glória, e de 2013, em Joinville, Coritiba e Atlético passaram meses longe de suas torcidas.

Devido à força das imagens, os dois episódios envolvendo a dupla Atletiba foram massacrados pela mídia e tratados por políticos e Justiça Desportiva como casos passíveis de "punição exemplar". Na verdade, os dois clubes foram usados com bodes expiatórios. E ponto.

A violência continua impregnada no futebol e continuará, enquanto permitirem que torcidas organizadas ditem as regras. Enquanto houver espaço reservado para vândalos nas praças esportivas. Enquanto a polícia escoltar bandidos mesmo sabendo que estão indo ao estádio apenas para gerar caos e medo. Proibir o consumo de cerveja ou punir clube A ou B com cinco, dez, 20 jogos sem mando de campo não vai resolver a situação, e isso já ficou absolutamente comprovado.

Cartolas e políticos precisam abrir os olhos definitivamente. Ou se impede a ação de torcidas organizadas e se acaba com o espaço de "visitantes" nos estádios (como na Copa do Mundo), ou Fred verá muitas outras mortes acontecerem.

Não é apenas a classe dos atletas profissionais que se sente ameaçada. É toda a sociedade.

Eduardo Aguiar é chefe de redação da Gazeta do Povo.

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