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As eleições desta semana na Europa demonstram uma preferência dos eleitores pelos candidatos conservadores, da direita, tanto na Alemanha quanto em Portugal. A explicação pode estar no fato de que a esquerda mudou o discurso para a direita, e o eleitor preferiu votar nos autênticos, que sempre foram conservadores.

Por falta de alternativas na economia, a esquerda foi adotando políticas conservadoras. Isso pode mostrar o coroamento da proposta da direita. Mas mostra também que a esquerda errou ao não se diferenciar com propostas revolucionárias em outros setores, mesmo mantendo o discurso conservador na economia.

Percebendo que o problema econômico não é mais ideológico, a esquerda precisa se afirmar com novas propostas, sobretudo nos aspectos sociais e ecológicos. A economia não é mais de direita ou de esquerda; ela é certa ou errada, responsável ou irresponsável. Mas o mundo precisa mudar e a diferença política agora é entre os que desejam mudar o mundo e aqueles que desejam manter o rumo da tragédia ambiental e social.

Como primeira tarefa, a esquerda deve libertar-se da economia, e libertar a economia. Libertar-se da economia trazendo o debate ideológico para outras áreas do mundo político e social; e libertar a economia da ideologia com que foi tratada. A esquerda está perdendo, não por ser desnecessária, mas por apresentar conceitos, atitudes e propostas obsoletos.

O que está em jogo no debate político não é a taxa de juros ou a estatização do mercado. Isso será administrado segundo necessidades definidas tecnicamente. O que está em jogo são os propósitos sociais e o equilíbrio ecológico, a definição de como caminhar sem danificar a eficiência do sistema econômico. A diferença entre esquerda e direita está nas metas sociais e ecológicas e na disputa pelo uso dos recursos públicos. À esquerda compete definir um grande objetivo social-político: garantir absoluta igualdade de oportunidade por meio de educação de qualidade para todos, na geração atual, e equilíbrio ecológico para todos, nas futuras gerações.

A esquerda do paraíso construído pela estatização dos meios de produção morreu, por isso está perdendo terreno em todas as partes. Mas a esquerda que conseguiu abandonar o estadismo obsoleto está correndo o risco de morrer também por falta de uma proposta alternativa, de novos sonhos revolucionários. Como a defesa de um sistema de educação de qualidade igual para todos; a garantia de um sistema de saúde que não diferencie pobres e ricos; um transporte público eficiente; a montagem de um sistema de justiça sem privilégios, e outros aspectos sociais.

A esquerda europeia terá dificuldades para defender essas bandeiras. Em parte, porque suas sociedades já estão perto de garantir esses direitos, em parte pelos preconceitos que as mantêm na esquerda, viciados no tema da economia. É por isso que hoje a esquerda está mais no outro lado do Atlântico, no EUA do Obama. Mas, aparentemente, essa ideia não seduz os políticos brasileiros, mais preocupados com o poder do que com a transformação, mais interessados em atender os privilégios do sistema atual do que em fazer uma mudança na estrutura da sociedade brasileira. Por isso, em 2010, aqui poderá acontecer o mesmo que vem acontecendo na Europa. Uma preferência pelos autênticos candidatos conservadores. Se é para ser conservador no governo, o eleitor pode preferir os que há décadas defendem nada mudar.

Sobretudo, depois que aqueles que se elegeram prometendo mudar, mostraram-se também conservadores.

Cristovam Buarque é senador (PDT/DF) e professor da UnB

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