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Vagarosamente, sem nenhuma pressa, assim como quem não quer nada, a majoritária e dócil bancada governista, nutrida na ceva do maior ministério de todos os tempos e seus ramais, foi empurrando com a barriga as duas CPIs do Apagão Aéreo que esperam a vez na fila das prioridades.

A da Câmara, já instalada e pronta para fingir que vai virar o Ministério da Defesa pelo avesso, cutucando no nervo exposto da inapetência do ministro Waldir Pires, foi desossada pela malandragem de capoeirista com a indicação de deputados desconhecidos, marinheiros de primeira viagem da Câmara que só conhecem o atalho da verba indenizatória, e dos conhecidos demais pelas suas habilidades em escapar de embaraços pelos rombos da cerca.

Esta semana já foi para o brejo. A visita do Papa Bento XVI ocupa desde hoje os espaços nobres na mídia, com a atração extra antecipada pelo presidente Lula na revelação da sua agenda para a audiência especial com o ilustre visitante. Em língua de gente, sem os adornos dos despistes, Lula pretende convencer o Papa a aceitar o apelo para ajudá-lo, como "a pessoa mais importante da Igreja Católica" a "disseminar as boas políticas públicas pelo mundo". As boas políticas públicas, bem entendidas, são as sociais que ele vem fazendo no Brasil. Ou, em miúdos, Lula pretende convidar Sua Santidade para ajudá-lo a carregar a cruz do governo, mal comparando, como marqueteiro de decisiva influência mundial.

Nas brechas possíveis, a turma da CPI do Apagão da Câmara, fará o possível para distrair o público arredio com a mímica do faz-de-conta. Enquanto a oposição se esfalfa na apresentação da lista de convocação de militares e civis com qualquer espécie de envolvimento com as trapalhadas que infernizaram milhares de usuários na ciranda dos vôos cancelados e nas horas, dias e noites de espera dos aeroportos, o governo mobiliza o seu pessoal para a montagem de uma rotina indolor de pedidos de informação, que devem entupir os armários com a papelada das desculpas burocráticas.

A CPI da Câmara é uma batalha perdida de véspera pela oposição e que não promete nada além de um mofino espetáculo de esperneio oratório. Bem entendido: da turma da oposição que não se equilibra em cima do muro, de olho comprido nos acenos dos que saltaram para a banda adesista.

O destino da CPI do Apagão do Senado é ainda uma incógnita. Mas, certamente, ainda povoa as insônias palacianas. Uma vez instalada, a maioria será oposicionista, indicando o presidente e o relator. E o Legislativo purga uma das piores, talvez a pior crise das últimas décadas, desde o fim dos quase 21 anos da ditadura militar do rodízio dos cinco generais-presidente.

O que legitima o mandato parlamentar é o voto que o credencia como representante do povo. Da queda de degrau em degrau de escada abaixo na confiança do povo, o atual Congresso bate os recordes históricos com o desmoralizante índice de 1,1% dos que ainda acreditam nos milionários agraciados com os seus votos.

E convém repetir o ensinamento da nossa crônica recente: sabe-se como começa uma CPI; não como ela acaba. Por mais que o governo feche o cerco para não deixar espaço para as manobras dos adversários, o outro lado não está tão anêmico e abandonado pelo desprezo da sociedade.

E uma CPI de maioria oposicionista é um convite, um estímulo para os que se consideram injustiçados e sob a ameaça de punição. Como é o caso dos controladores civis de vôo que anunciam que encaminharão às duas CPIs pastas de documentos que denunciam irregularidades, desde a suspeita concentração de verbas para as reformas dos aeroportos e que deixaram à míngua a área técnica e outras, mais cabeludas de manipulação de recursos que sumiram pelos ralos de sempre.

E, vamos e venhamos: no balanço da contradição, o governo não está com a bola cheia, quicando na grama rala.

Villas-Bôas Corrêa é analista político.

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