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Conciliar o espaço privado de viúvas e jovens na região central é difícil. Mas são eles que ocupam essa região da cidade e devemos fazer todo o possível para mantê-los atraídos pelo Centro

Até os anos 1970 o Centro de Curitiba era o bairro mais populoso da cidade. Hoje, não está nem sequer entre os 10 principais bairros em número de habitantes. Verdade que muitos bairros surgiram e cresceram desde então. O problema é que, ao mesmo tempo em que esses outros bairros cresceram, o Centro perdeu população. E isso apesar de ainda concentrar número expressivo de empregos, de ter equipamentos urbanos de qualidade, de seus moradores terem à porta a maior oferta de linhas de ônibus, e fácil acesso ao sistema viário principal da cidade.

Nesse esvaziamento, duas características chamam a atenção: o excesso de viúvas e a falta de lavabos.

As pirâmides etárias mostram o número de habitantes por idade e por sexo em cada bairro. O nome pirâmide indica que a base (crianças) seria maior que jovens, seguidos pelos adultos, em menor número, finalizando com idosos. Há décadas, com a diminuição do número de filhos por família, o que temos é a base da pirâmide (crianças) um pouco menor que os adolescentes e jovens, que são mais numerosos do que os adultos, que são mais numerosos do que os idosos. No Centro de Curitiba, porém, a distribuição etária tem algumas peculiaridades. A base da pirâmide é muito mais estreita do que nos demais bairros – e como nas pirâmides de fato, a base estreita dificulta seu equilíbrio. Já os jovens, entre 19 e 29 anos, são muito mais numerosos do que nos outros bairros. Mas eles só estão de passagem pelo Centro. Poderíamos imaginar que um jovem com 20 a 25 seria filho de um casal de adultos de 40 a 50 anos. Porém, ao ver a proporção desses adultos no Centro, cada casal teria de ter mais de quatro filhos cada um para justificar o número de jovens no Centro. Seria uma das maiores taxas de fertilidade no mundo – o que não é o caso. Conclusão é que esses jovens moram sozinhos, não fazem parte de famílias estabelecidas no Centro.

Isso não quer dizer que não seja bom termos jovens morando no Centro. É claro que é. O ponto é que esses jovens, universitários e profissionais recém-formados, quando decidem constituir família, deixam o Centro (daí a baixa natalidade no bairro). Há, com isso, uma alta rotatividade dos imóveis de aluguel na região central, mas um mercado de compra e venda menos importante.

Por outro lado, o Centro é um dos bairros com maior concentração de idosos de Curitiba, o que é comum nas grandes cidades. Mas aqui ainda há uma peculiaridade: a proporção de mulheres idosas no Centro é muito maior do que a de homens. Ou seja, são viúvas.

Assim, a demografia do Centro de Curitiba tem duas populações características: jovens universitários e viúvas. Essa combinação merece atenção especial dos programas de reversão do despovoamento desse bairro. Isso porque, por mais díspares que possam parecer viúvas e universitários, eles têm uma característica em comum: não se reproduzem. Os idosos já deixaram a idade fértil, e os jovens estão deixando o Centro quando decidem constituir família e comprar um imóvel. E por que não compram os imóveis das viúvas idosas quando elas morrem? Pois as demandas do espaço doméstico mudaram muito para essas duas gerações. Uma pesquisa sobre as ofertas de apartamentos para aluguel e venda em diferentes bairros da cidade nos mostra que os apartamentos antigos, com a mesma área, tinham cômodos amplos, mas em menor número. E o que lhes falta, se comparados aos apartamentos com mesma área em outros bairros? Suíte e lavabo. Assim como a cozinha e sala, o banheiro costumava ser uma área comum nos domicílios dos anos 1960, mesmo nos anos 1980; hoje, e cada vez mais, são área privativa e, na medida do (im)possível, individual. Outra ausência marcante nos apartamentos centrais é a falta de vagas de garagem – quando há, há uma por apartamento, não uma por morador, como parece ser uma tendência nos novos apartamentos.

Ou seja, conciliar o espaço privado dessas duas populações da região central, viúvas e jovens, é difícil. Mas são eles que ocupam essa região da cidade e devemos fazer todo o possível para mantê-los atraídos pelo Centro, com espaço público de qualidade, investindo em áreas livres e calçadas bem cuidadas (com acessibilidade para idosos), serviços públicos de referência, redução da pressão automobilística, pois afeta uma população que usa menos o carro. Enfim, a convivência de universitários e idosos no Centro é uma oportunidade de termos uma convivência de diferentes gerações que deve ser valorizada como um exemplo da vitalidade possível da nossa área central.

Fabio Duarte, arquiteto e urbanista, é professor da PUCPR. Este texto integra uma rodada quinzenal juntamente com os arquitetos Clovis Ultramari, Irã Dudeque e Salvador Gnoato.

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