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Os recentes dados divulgados pelo Escritório das Nações Unidas para as Drogas e o Crime (UNODC), no fechamento do ano de 2013, considerados os países que atualizaram seus dados, coloca o Brasil, em relação ao número de homicídios, na nona posição entre os países mais violentos do mundo. Assim estão escalonados os dez países mais violentos do planeta: Honduras (91,6 mortes para cada 100 mil habitantes), El Salvador (69,2), Jamaica (41,2), Belize (39), Guatemala (38,5), Bahamas (36,6), Colômbia (33,2), África do Sul (30,9), Brasil (27,1) e Trinidad e Tobago (26,1). Para que se tenha ideia da magnitude do assassinato de 27,1 pessoas por 100 mil habitantes registrado no Brasil, vale considerar que, nos dez países menos violentos, a média não passa de uma morte a cada 100 mil habitantes.

Disparidade tão grande encontra seus fundamentos na política adotada para o equacionamento dos conflitos sociais. Os dados da UNODC demostram que a redução da violência é diametralmente oposta ao maior incremento de medidas punitivas pelo Estado. Em outras palavras, os países mais violentos são os que mais apostam em medidas de conteúdo punitivo para tratar da questão da conflitividade social, enquanto os que conseguem reduzir a violência desenvolvem políticas públicas sérias de conscientização, desenvolvimento social e de cultura da solidariedade e de busca racional e equilibrada de solução para os conflitos.

A linguagem estatal da violência é importante fator de disseminação da agressividade no corpo social, fazendo com que as pessoas reajam de forma sempre mais brutal quando se sentem contrariadas. O incremento punitivo, além de servir como fator de pulverização da linguagem da violência, atua de maneira direta na produção da omissão no desenvolvimento de políticas públicas de bem-estar social, pois a aposta nos meios de força faz prevalecer a lógica perversa de que, como já pune quem erra, não há mais nada que caiba ao Estado fazer.

A violência estatal também dissemina a corrupção. O controle da força de coerção confere poderes excepcionais a quem o tem, abrindo um campo de negociações entre quem seria passível de punição e quem decide se ela será ou não imposta. Com isso, a seletividade do sistema, em que o que se pune não é a prática de determinado fato criminal, mas sua prática por alguém que não goze de meios para obter proteção, se potencializa.

O amálgama de violência, corrupção, omissão de políticas públicas e seletividade faz a agressividade no Brasil ingressar em crescimento exponencial cada vez mais preocupante, em especial por ganhar espaço o discurso nazifascista de que somente se faz justiça quando se pune, ou seja, quando o Estado canaliza brutalidade.

A resolução dos conflitos sociais depende da utilização de estratégias mais profundas que o simples emprego de punições. Os mais variados atos de crueldade – como, por exemplo, a morte de doentes sem atendimento médico e os estupros dentro dos cárceres, sob o olhar insensível da sociedade e dos que afirmam representá-la – têm sido praticados no Brasil para satisfazer a lógica da agressão do Estado contra o condenado, banalizando a violência e produzindo uma sociedade mais brutal, atualmente já a nona mais violenta do planeta, superando inclusive países com guerra em andamento.

Quem sabe, em poucos anos, com a insistência, desde o período colonial, nos mesmos equívocos, cheguemos ao primeiro lugar no ranking.

Adel El Tasse, procurador federal, é professor de Direito Penal e coordenador, no Paraná, da Associação Brasileira dos Professores de Ciências Penais.

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