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As bases do Plano de Metas da gestão Juscelino Kubitschek (JK) foram montadas ainda no governo Vargas em dois estágios ou instituições: a Comissão Mista Brasil–Estados Unidos (CMBEU) e o Grupo Misto BNDE–Cepal. A CMBEU funcionou entre 1951 e 1953, dedicando-se à formulação de projetos potencialmente financiáveis pelo Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos (Eximbamk) e pelo Banco Mundial.

O Grupo BNDE–Cepal, formado em 1954, procedeu a um diagnóstico minucioso da economia brasileira, identificando seus grandes gargalos estruturais e os segmentos industriais com procura reprimida, em razão das restrições às importações impostas pelos freqüentes problemas cambiais. A dimensão dos projetos voltados ao suprimento da demanda insatisfeita representaria tanto um fator determinante da envergadura da desobstrução dos pontos de estrangulamento quanto um ponto de germinação, sobretudo quando o alvo do investimento fosse a área de infra-estrutura.

A necessidade de ampliação da base industrial e, por conseqüência, da capacidade de financiamento do sistema econômico, engendrou iniciativas do governo JK na definição de uma estratégia global de desenvolvimento e da forma de articulação entre capitais privados (nacional e estrangeiro) e estatais; na fixação de metas industriais executadas e monitoradas por Grupos Executivos (GEs), como química, celulose e papel, metais não ferrosos, cimento, automobilístico, etc.; na ampliação do raio de proteção ao mercado interno através de restrições às importações (tarifas, estabelecimento de limites quantitativos e política cambial); no fomento via BNDE; e no aumento da participação estatal direta por meio de inversões em infra-estrutura e em indústrias básicas.

Em contraste com a era nacionalista de Vargas que a antecedeu, a gestão JK exibiu uma natureza submissa ao investimento direto das multinacionais. Tanto que, não obstante a expansão econômica ter estado assentada no tripé capital estatal–estrangeiro–nacional, as atribuições de cada "parceiro" comprovam o tratamento preferencial dispensado às empresas privadas estrangeiras.

Nesse ponto, é oportuno sublinhar que o padrão de financiamento do Plano de Metas dependia da sincronização entre a entrada líquida de poupança externa (capitais de risco e de empréstimo), o aumento da participação direta do setor público na formação bruta de capital fixo, e a política monetária expansionista, viabilizando recursos públicos para áreas estratégicas, mediante o acesso a créditos externos e às linhas subsidiadas do BNDE para os ramos pesados e, do Banco do Brasil, para os segmentos leves, particularmente para a obtenção de capital de giro.

A vitrine do projeto desenvolvimentista de JK era composta pela rápida incorporação dos fabricantes de bens de consumo duráveis e pela consolidação complementar dos bens de produção dentro do sistema econômico do país, com predominância de um pequeno número de peças estrangeiras, com elevadas escalas de produção e de capital.

Tal processo abriu espaço para a oligopolização e o controle externo da economia brasileira, em função do pronunciado ingresso de capital de risco multinacional, reflexo da conjugação entre a intensificação da concorrência nos principais mercados capitalistas mundiais (americano, europeu e japonês) e a identificação de oportunidades de investimentos nos grandes mercados do Terceiro Mundo, formados pela substituição de importações.

Todavia, apesar das enormes mudanças propiciadas no aparelho industrial do país entre 1956 e 1961, a política econômica de JK apresentava algumas incongruências que explicam, de um lado, a necessidade de meios ainda mais abrangentes e consistentes para sustentar uma maior diversificação econômica e, de outro, a emergência da crise dos anos 60, marcada pela subutilização da capacidade produtiva.

Nessas circunstâncias, o aprofundamento da industrialização brasileira, provocado pelo Plano de Metas, não logrou êxito na constituição de uma matriz de produção autônoma e auto-sustentada, especialmente pela natureza ainda incompleta do departamento fabricante de bens intermediários e o insuficiente tamanho do mercado interno para a produção e absorção de bens com maior conteúdo tecnológico.

No final das contas, o salto industrial mudou apenas a característica da relação do Brasil–periferia com as economias centrais, permanecendo a situação de crescentes desequilíbrios no balanço de pagamentos. Se até os anos 20 a fragilidade externa era explicada pela deterioração dos termos de intercâmbio dos produtos primários exportados, a partir do início da década de 60 a condição de dependência foi agravada pela necessidade de pagamento dos serviços da dívida externa de curto prazo e pelo aumento das remessas de lucro, associado à internacionalização da economia brasileira. Ou seja, o eixo da subordinação sofreu um deslocamento, passando das crônicas oscilações da demanda para o atrelamento financeiro e tecnológico ao núcleo dinâmico da economia mundial.

Gilmar Mendes Lourenço é economista e coordenador do Curso de Ciências Econômicas da UniFAE – Centro Universitário – FAE Business School.

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