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Mais uma rebelião com saldo de mortos e feridos que abre as feridas do sistema penitenciário brasileiro e reforça a necessidade urgente de mudanças. A rebelião na Penitenciária Estadual de Cascavel (PEC) terminou com cinco presos mortos, 25 feridos, três desaparecidos, além de dois agentes que foram feitos reféns e liberados após negociação.

A superlotação, a violência, a escassez de recursos e a falta de assistência jurídica e acesso a serviços de saúde, dentre outras séries de questões, são constantemente denunciadas por organizações da sociedade civil e do poder público que realizam, com regularidade, visitas a unidades prisionais. Se tais denúncias tivessem sido apuradas e as devidas mudanças, realizadas, essas mortes e a violência poderiam ter sido evitadas. Conforme informou a Gazeta do Povo, em 2012, a Comissão de Direitos Humanos da OAB/PR já havia avaliado aquela unidade como a pior penitenciária do Paraná.

Entre as motivações da rebelião estavam a má qualidade da comida oferecida aos apenados, a falta de material de higiene e a violência na unidade. As principais demandas feitas eram pelo fim das agressões dentro do presídio e do abuso nas revistas, melhoria na comida e na estrutura do presídio e também pela celeridade no julgamento de processos. Para se ter ideia, de acordo com um levantamento da Defensoria Pública estadual, pelo menos 15 presos já haviam cumprido sua pena e um deles teve alvará de soltura expedido durante a rebelião.

A ideia fixa da prisão como o único modelo punitivo fez com que o Brasil chegasse a ter a terceira maior população carcerária do mundo sem conseguir satisfazer as necessidades e direitos básicos dessa população. Ao contrário do que se poderia esperar com uma política criminal que prioriza o encarceramento, não estamos mais seguros porque há mais pessoas presas. Entre 2000 e 2012, a população carcerária cresceu 135%, mas não houve impacto real nas taxas de criminalidade – e nem haveria de ter, já que prisão não é instrumento de prevenção da violência.

Casos como o de Cascavel nos impõem uma reflexão necessária sobre os rumos da justiça criminal no país. Hoje, são mais de 500 mil homens e mulheres presos em todo o país, submetidos a condições subumanas, maus tratos, e que têm direitos básicos, previstos na Lei de Execuções Penais, sistematicamente negados, como a assistência judiciária e acesso aos serviços de saúde. Além disso, dados citados pelo Ministério da Justiça apontam que o índice de reincidência entre ex-cumpridores de penas privativas de liberdade, como aqueles reclusos no presídio paranaense, pode chegar a 85%.

Aonde esperamos chegar quando abandonamos pessoas em "masmorras medievais", nas palavras do ministro da Justiça, cuja taxa de fracasso é de 85%? É chegado o momento de a sociedade pensar em novas alternativas para cessar essa lógica de encarceramento em massa. Sabemos que nosso sistema de justiça criminal pautado no aprisionamento não é capaz de prover a segurança desejada pela sociedade. As soluções existem, e essa mudança é possível. Diante deste quadro, as alternativas penais se apresentam como uma possibilidade de modernização do sistema criminal brasileiro. São medidas legais que apresentam soluções economicamente viáveis e socialmente justas para velhos problemas com os quais os gestores nunca souberam lidar. Eis aí uma chance de evitar a repetição de cenas lamentáveis como aquelas vistas em Cascavel.

Maria Gorete Marques de Jesus é pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência (NEV/USP) e membro do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

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