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Violar direitos humanos em nome dos direitos humanos: é o que justifica o crime de clandestinidade criado no dia 8 de agosto pelo governo de Sílvio Berlusconi. A nova lei de segurança torna realidade o crime de imigração clandestina na Itália e autoriza a detenção de estrangeiros irregulares por até seis meses.

Quarenta dias depois, o cerco cruel aos imigrantes alcança a magistratura e abre o precedente que outros países esperavam. As primeiras condenações tiveram lugar em Milão, em clima de insegurança jurídica e cercadas por dúvidas sobre como aplicar a lei. Dos quatro primeiros julgamentos resultaram quatro diferentes decisões, denotando que a novíssima legislação gera confusões de aplicabilidade tais como: se por "expulsão imediata" se entende a necessidade ou não de comprar um bilhete de retorno do condenado ao seu país de origem. Em um dos casos a sentença previu multa de 5 mil euros e expulsão. Em outros dois casos a multa fixada foi de 7,5 mil euros, podendo ser reduzida para 5 mil euros se o pagamento ocorrer dentro de dois meses. O quarto caso condenou o imigrante diretamente à expulsão. Outras medidas permitidas pela lei incluem multa de até 10 mil euros e pena de seis meses a um ano para aqueles imigrantes que, uma vez notificados, permaneçam no país.

A confusão legislativa, no entanto, não foi capaz de desestabilizar o convencimento judicial. Sendo elemento fundamental em qualquer processo, o convencimento do juiz está plasmado neste caso na culpabilização da imigração como sendo um mal a ser extirpado da sociedade italiana. A evidente violação de direitos fundamentais consagrados constitucionalmente e internacionalmente não foi considerada pelos magistrados, que não hesitaram em aplicar estritamente a lei com eficiência e no tempo esperado. Em lugar de buscar formar a convicção, recomendável pela melhor doutrina como quesito de um julgamento adequado, os juízos de "Milan" optaram por validar juridicamente as decisões políticas de um governo que adota bárbaras medidas contra seres humanos em nome de supostos direitos humanos. Somente a compreensão do fenômeno da inversão ideológica, nos termos ensinados por Franz Hinkelammert, é capaz de explicar a grave validação das chamadas rondas de cidadãos voluntários, incitando o preconceito e a intolerância e contribuindo para o clima de hostilidade em relação às minorias.

O comendatori realiza oitenta anos mais tarde algo que nem o Duci teria ousado. Ainda há juízes em Roma ou em Es­­trasburgo?

Carol Proner, doutora em Direito, é professora de Direito Internacional da Unibrasil

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