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Sucessivos absurdos, como o vazamento de óleo da empresa Chevron, ocorrem todos os dias no Brasil, sem qualquer atuação con­­tundente do poder público

Estamos nos sentindo como alvo de um incomensurável acidente ambiental, de proporções bíblicas, como o famigerado desastre do Golfo do México, nos EUA, também causado por uma empresa estrangeira.

Para todos, a Chevron é a grande vilã de todo o drama, da mesma forma que a BP foi no desastre ocorrido nos Estados Unidos, o que traduz a ideia de que se trata do grande capital estrangeiro, o qual apenas quer explorar nossas riquezas sem qualquer preocupação com a conservação de nosso meio ambiente.

Tal raciocínio é bastante popular, pois sempre coloca nós, brasileiros, como grandes vítimas dos inescrupulosos estrangeiros, causadores de todos os nossos problemas, incluindo o inafastável subdesenvolvimento. Como é bom jogar a culpa de nossos problemas para os outros! Entretanto, não é bem assim que as coisas ocorrem por aqui.

Apenas para ficar na seara de derramamento de petróleo, vale a pena citar exemplo de um empreendimento de uma empresa que é tida como uma magnífica conquista do Brasil, além de modelo de operação e zelo ao meio ambiente: o Terminal Norte Capixaba, operado pela Transpetro, braço de transporte da Petrobras.

Operando desde 2006 em uma região que consistia em Unidade de Conservação Ambiental, a antiga Estação Ecológica da Barra Nova, a qual foi desconstituída para a instalação do empreendimento, o terminal, que promove o escoamento da produção petrolífera da região norte do Espírito Santo, teve ao menos quatro acidentes por ano, e um desses de consideráveis proporções, pois ocorreu em operação não licenciada pelo órgão ambiental responsável. Além disso, desde o início de sua operação, o empreendimento funciona com licenças ambientais vencidas ou que jamais tiveram grande parte de suas condicionantes cumpridas.

Com isso, os grandes prejudicados integram a comunidade pesqueira da região, cada vez mais depauperada e sem qualquer expectativa de futuro. Esse é o grande legado do grandioso empreendimento da Petrobras para as tradicionais comunidades da região.

Sobre o fato, o que fazem as autoridades competentes, órgão ambiental, Ministério Público e Poder Judiciário, todos devidamente acionados pelos cidadãos? Nada! Apenas "empurram com a barriga" a situação, na esperança de que a comunidade se canse de buscar seus direitos.

Para quem já teve o prazer de ler a obra de Raymundo Faoro, Os Donos do Poder, é o retrato da maior opressão que sofre o povo brasileiro, a qual advém dos próprios brasileiros, cada vez mais corruptos, não de terras estrangeiras. Seria bastante animador se tal situação ocorresse apenas no Espírito Santo, mas a realidade é bem diferente.

Sucessivos absurdos semelhantes ocorrem todos os dias nos mais diversos recantos do Brasil, sem qualquer atuação contundente do poder público, especialmente do Ministério Público e do Judiciário.

Tal constatação não pode servir para que, mais uma vez, nós brasileiros transfiramos a culpa para o poder público. Não podemos esquecer que somos nós, que formamos e integramos todas as instituições deste país, as quais apenas espelham nossos próprios defeitos como cidadãos.

Brasileiros, está na hora de pararmos de "empurrar com a barriga" os nossos problemas, tentar resolvê-los (leia-se: acobertá-los) com nosso tradicional "jeitinho" e transferir a culpa para outros, senão jamais seremos o país do presente.

Tomemos vergonha e transformemo-nos em uma verdadeira República, na qual reconheçamos que devemos servir ao Estado para que ele nos seja útil e não apenas nos sirvamos egoisticamente do Estado e de nosso patrimônio coletivo.

Luís Henrique Braga Madalena, advogado, especialista em Teoria Geral do Direito e em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional, é membro da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/PR e membro do Instituto dos Advogados do Paraná.

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