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No seu primeiro pronunciamento desde a prisão de dirigentes de empreiteiras no escândalo da Petrobras, a presidente Dilma Rousseff exaltou o mérito do governo de estar investigando a corrupção "pela primeira vez na história do Brasil". Fantástico!

Em primeiro lugar, amigo leitor, o governo não está apurando nada. Ao contrário. Está sendo investigado. O juiz federal Sergio Moro não é um contínuo do Palácio do Planalto. É representante de outro poder da República. A Polícia Federal, independente e eficiente, não é um departamento subordinado aos interesses, caprichos e ordens da doutora Dilma Rousseff. O pronunciamento da presidente só pode ter duas explicações: cinismo ou preocupante desligamento da realidade.

A Operação Lava Jato vai compondo um quadro de corrupção que arranhou gravemente a história, a saúde financeira, a marca e o futuro de um ícone do Brasil. A atual presidente da República não é uma espectadora passiva da tragédia. O escândalo permeou os mandatos de Lula e estourou com força no atual governo. Dilma foi ministra de Minas e Energia, chefe da Casa Civil e presidente do Conselho de Administração da Petrobras no governo Lula. A presidente, conhecida por seu perfil centralizador e autoritário, não pode fazer de conta que está em outro planeta. Ela está, queira ou não, no olho do furacão.

Mas o cinismo ou desligamento da realidade é uma doença que vai contagiando todos os integrantes do governo e seus aliados. Graça Foster mostrava surpresa e indignação com as denúncias de corrupção na empresa sob sua responsabilidade. Nada sabia, nada tinha visto. Agora, premida pela força dos fatos, reconheceu, por exemplo, que sabia "há meses", por empresa holandesa, de pagamento de propina na estatal. Mas o que mais surpreende é a decisão "saneadora" de Graça Foster: criar uma diretoria de governança para o "cumprimento de leis e regulamentos internos e externos". É como se a Petrobras, nos dois mandatos de Lula e no governo Dilma, não tivesse mecanismos de autocontrole. É brincadeira! A nova estrutura, uma nítida jogada de marketing, é quase um insulto.

Chegou a hora da verdade para governantes e políticos. A sociedade está cansada da empulhação. Os culpados pela esbórnia com dinheiro público, independentemente da posição que ocupem na cadeia corruptora, devem ser exemplarmente punidos. E isso não significa, nem de longe, ruptura do processo democrático, golpismo ou incitamento à radicalização.

Dilma foi reeleita legitimamente. Pregar um golpe, explícita ou implicitamente, é tudo, menos comportamento democrático. Isso não significa, por óbvio, admitir barreiras protetoras absurdas ou chancelas de impunidade. Todos, incluindo a atual presidente, podem e devem ser responsabilizados por seus atos.

A imprensa tem função relevante no momento que vivemos. Um condenado do mensalão se referiu à imprensa que desencadeia a pressão popular contra homens públicos aéticos e governantes corruptos, comparando-a, com cinismo, à "ditadura militar". Tais declarações, característica de políticos apanhados com a boca na botija, não devem preocupar. Afinal, todos, independentemente do seu colorido ideológico, procuram o bode expiatório para justificar seus crimes, deslizes e malfeitos. A culpa é da imprensa! O grito é uma manifestação de desprezo pela verdade.

Os meios de comunicação social existem para incomodar. Um jornalismo cor de rosa é socialmente irrelevante. A imprensa, sem precipitação e injustos prejulgamentos, tem o dever de desempenhar importante papel na recuperação da ética na vida pública. Nosso compromisso não é com celebridades, mas com a verdade, com a informação bem apurada, com os leitores. E nada mais.

Carlos Alberto Di Franco, doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciências Sociais (Iics).

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