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A notícia da decretação, por ato do presidente do Banco Central, de Regime de Administração Especial Temporária (Raet) no Banco Cruzeiro do Sul S/A e de quatro sociedades do mesmo grupo empresarial traz em si conteúdo preocupante, quanto mais se interpretada em coordenação com os recentes dados econômicos e medidas de reativação da economia adotadas pelo governo federal, que indicam contágio do Brasil pela crise econômica global, em que pese o esforço das autoridades governamentais em demonstrar o contrário.

A euforia de crédito verificada nos últimos tempos em nosso país, impensável há poucos anos, possibilitou o acesso de uma enorme massa de partícipes ao mercado de consumo, com a aquisição simultânea de bens muitas vezes supérfluos, em desproporção à renda familiar, tendo-se conhecimento de casos extremos em que famílias de classe baixa adquiriram dois ou três veículos simultaneamente, além de trocar todos os seus eletrodomésticos por modelos novos. O que importava era a parcela.

Em tais circunstâncias, as instituições financeiras cobravam os juros que bem entendiam, e passavam a gerir enormes carteiras de crédito – em alguns casos, respaldadas por garantias dos próprios bens adquiridos; em outros, no chamado crédito consignado. Ocorre, entretanto, que a falta de hábito dos tomadores de empréstimos em administrar suas dívidas fez com que os índices de inadimplência saltassem a patamares muito elevados, o que, aliado ao fato de os bancos federais terem baixado sobremaneira suas taxas de juros, comprometeu o equilíbrio econômico-financeiro das instituições financeiras que operam somente com foco no crédito pessoal.

Os motivos para a instauração de tal regime especial foram, conforme o Ato-Presi n.º 1.217, de 4 de junho de 2012, o "comprometimento da situação econômico-financeira e a grave violação das normas emanadas do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central do Brasil". Eufemismo para quebra.

Estamos, então, vendo o estouro de uma bolha de crédito pessoal, a exemplo das bolhas de crédito imobiliário que se viram nos Estados Unidos e na Espanha?

O que traz preocupação, neste momento, é o risco sistêmico, ou seja, a possibilidade de que mais instituições financeiras também sejam atingidas, o que gera a desconfiança dos investidores nos papéis das instituições financeiras que atuam no setor de crédito e de seus correntistas, os quais, naturalmente, receosos de amargar perdas, transferem seus recursos para instituições que acreditam sólidas. É o que se vê, em outra medida, ocorrer na Grécia, na Espanha e na Itália, onde há fuga em massa de capitais para os bancos alemães, tidos como imunes à crise que assola o continente europeu.

Há um ditado popular macabro que diz que acidente de avião nunca vem sozinho, que sempre mais dois ocorrem em curto espaço de tempo. Por analogia, pode-se dizer que "intervenção" também não vem sozinha, pois as medidas a serem tomadas pela autoridade monetária devem ser abrangentes e eficazes. O que se espera, assim, é que o Banco Central do Brasil tome as medidas necessárias para acalmar o mercado financeiro, injetando os recursos necessários para evitar o risco sistêmico de quebras, naturalmente lançando mão das medidas legais que assegurem a responsabilização pecuniária dos controladores e administradores das instituições que vierem a ser objeto do regime especial, evitando-se que o prejuízo recaia, como habitualmente sói, no bolso do contribuinte.

Fabio Malina Losso, advogado de Losso, Tomasetti & Leonardo, é doutor em Direito Civil pela USP e membro do Conselho da Harris School of Public Policies, da Universidade de Chicago. É liquidante do Banco de Desenvolvimento do Paraná S/A (Badep).

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