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A defesa, pelos urbanistas, da verticalização do solo urbano pelo setor imobiliário e do adensamento ao longo de corredores de transporte coletivo é posicionamento há muito observado nas discussões sobre a cidade. De tempos em tempos, ouve-se isso como se fora novidade. O debate atual sobre o novo Plano Diretor de São Paulo, por exemplo, fundamenta-se na implantação de tais corredores; no dos planos de Curitiba, igualmente fala-se não apenas na manutenção dos corredores, mas também em sua eventual ampliação e também no adensamento ainda maior de outras áreas.

O plano que estabelece os eixos de Curitiba é de 1965. De lá para cá, avançou-se numa liberação processual das áreas próximas, sobretudo as chamadas ZR4: inicialmente previstas para quatro pavimentos, hoje permitem oito. O número ideal é difícil de estabelecer; temos clareza a respeito de uma certa "banda" de valores que parecem atender aos princípios adotados da boa relação entre volume demográfico e infraestrutura instalada. O que não provoca dúvida é a hierarquia desse volume ou adensamento demográfico: inicia-se bastante elevado ao longo dos eixos estruturais, reduzindo para as zonas vizinhas. Tal hierarquia, além de respeitar o princípio da boa relação entre número de moradores e infraestrutura instalada, facilita ao morador da cidade a compreensão da legislação de zoneamento do uso e ocupação do solo.

Essa leitura facilitada não significa uma simples ferramenta pedagógica, mas sobretudo de controle cidadão de como se constrói ou como se modifica nossa cidade. Quaisquer transformações nessa hierarquia devem, pois, levar em conta essa necessária clareza de traçado urbanístico que tanto distingue a cidade de Curitiba no cenário nacional e internacional. Isso configurou uma paisagem urbana que foi intencional e é algo que não pode ser desprezado, sob pena de se perder parte da identidade da cidade construída pela linearidade da volumetria do conjunto de suas construções.

Há muito tempo, urbanistas perseguem fórmulas para justificar suas posições de ampliação ou redução de parâmetros de adensamento, mas todas elas permitem uma imprecisão em termos de número. Quanto exatamente podemos verticalizar um determinado compartimento urbano sem a necessidade de ampliações na infraestrutura urbana e nos serviços sociais? Mais importante ainda: quanto uma nova verticalização implica impactos negativos na sociabilidade da cidade? Quanto se perde da paisagem custosa e longamente construída? Se não temos esses números, como podemos nos posicionar na discussão sobre a criação de novas áreas verticalizadas em Curitiba fora dos seus eixos estruturais?

Em primeiro lugar: se reduzirmos a clareza da hierarquia de adensamento que se busca há tanto tempo, qualquer proposta nesse sentido perderia a força. Segundo: se ainda há espaços livres a ocupar ao longo dos atuais eixos de transporte ou das ZR4, também não se vê razão para essa ampliação. Terceiro: e se alguém disser que não se ocupa ainda mais as áreas hoje com parâmetros urbanísticos elevados porque a especulação imobiliária não permite? Responderemos que há instrumentos de combate de tal prática e que devem ser aplicados. Ou seja, mesmo sem uma fórmula matemática que nos diga com clareza o quanto ainda devemos e podemos crescer em densidade (ou em altura), a conclusão é que o melhor é deixar como está. Pelo menos até que tenhamos alguma justificativa mais mensurável ou um desenho melhor.

Maria Luiza Marques Dias, arquiteta e urbanista, é professora do Departamento de Arquitetura da UFPR e coordenadora do Plano Diretor da mesma universidade.

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