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A esmagadora maioria da população não está preocupada atualmente com a cor da pele de Obama e sim com sua eficiência para conduzir o país

Robert de Niro resolveu ironizar os que há quatro anos perguntavam aos sussurros (pois se falassem alto seriam processados, acusados de discriminação) se os Estados Unidos estariam "prontos para um presidente negro". Em discurso em um banquete promovido por Michelle Obama para arrecadar fundos para a campanha de reeleição do marido, perguntou à plateia "se os Estados Unidos estavam prontos para ter uma primeira-dama branca". A plateia delirou, ele completou com mais ironia, "cedo demais, não é?", todos aplaudiram. Os republicanos, que não têm qualquer vestígio de senso de humor, ficaram indignados com o ultraje e a humilhação às esposas brancas dos seus pré-candidatos, Mitt Romney, Rick Santorum e Newt Gingrich. De Niro teve de explicar que era uma piada e se desculpar antes que o assunto virasse uma crise política.

Os norte-americanos são assim mesmo: primeiro conseguem, em menos de 50 anos, eliminar séculos de discriminação racial no emprego, na educação, na vida pública, uma tarefa hercúlea. Depois, dão uma demonstração de maturidade cívica e política, elegendo um negro para a Presidência, algo que dez entre dez cientistas políticos consideravam "cedo demais". Agora, gastam energia discutindo se os brancos foram humilhados por outro branco, partidário do candidato adversário. Porém, não fosse pela piada mal-recebida de De Niro, a raça dos candidatos não seria mais um tema de campanha. A esmagadora maioria da população não está preocupada atualmente com a cor da pele de Obama e sim com sua eficiência para conduzir o país.

Minha admiração pelas instituições políticas e legais dos Estados Unidos é bem conhecida: um país que consegue superar problemas gigantescos como a discriminação racial, a cizânia criada pela guerra do Vietnã, o atentado do 11 de setembro e o desastre que foi George W. Bush, merece ser respeitado e, na minha opinião, admirado. É claro que nada há a admirar na incapacidade ianque para enfrentar o lobby dos vendedores de armas que invocam o princípio constitucional escrito no século 18 a respeito do direito dos cidadãos se defenderem portando armas. Isso resulta nos massacres periódicos de inocentes imolados por desequilibrados armados; nem na insistência no bloqueio de Cuba quando a ilha dos Castro não representa qualquer ameaça, apenas para manter os votos dos cubanos-americanos de Miami, ao custo de prolongar a miséria que a ditadura cubana mantém a ferro e fogo há seis décadas. Mas o conjunto da obra é grandioso.

Por que essas reflexões? Porque provoca uma profunda melancolia observar que no país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza, nossas instituições continuam frágeis e vulneráveis ao que há de pior na política e na governança pública. O Congresso se rebela contra a presidente não porque ela esteja se posicionando contra determinadas posições políticas ou partidárias, mas porque ela não nomeou os indicados de uns e de outros para determinados cargos e não liberou as "emendas parlamentares" que fazem as delícias de muita gente. E a corrupção nacional está tão disseminada que um repórter disfarçado de comprador de um hospital público pede propina a fornecedores que nunca havia visto antes e imediatamente é atendido, entre gargalhadas.

Agora que a imprensa denunciou o fato todos estão indignados, os corruptores estão sob "rigorosa investigação" da CGU, dos Ministérios, da Polícia Federal e do Ministério Público, com a promessa de "punições exemplares". Será que estamos prontos para ter um país em que a corrupção descoberta é punida exemplarmente? Ou será "cedo demais"?

P.S.: dois caríssimos amigos foram homenageados na semana que passou: Nilson Monteiro, novo Cidadão Honorário do Paraná; e Leo de Almeida Neves, que completa 80 anos. Nilson é um exemplo de profissionalismo e de integridade associados à obsessão pela justiça social. Leo é e o tipo de intelectual e político que eu gostaria de ver dominando a vida pública brasileira. Com gente como eles, este artigo não estaria falando em melancolia e sim em esperança fundada de dias melhores.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

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