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A recente decisão do STF coloca uma pá de cal sobre o assunto e sedimenta o entendimento em prol da penhorabilidade do bem de família
A recente decisão do STF coloca uma pá de cal sobre o assunto e sedimenta o entendimento em prol da penhorabilidade do bem de família| Foto: Pixabay

Uma das grandes preocupações quando se vai alugar um imóvel é como assegurar o cumprimento das obrigações do contrato, em especial o pagamento de eventuais débitos (tanto de aluguéis e encargos quanto a título de reparos). Dentre as modalidades possíveis de garantia ao contrato de locação, as mais conhecidas são a fiança pessoal (fiador) e o depósito – ou valor caução, como é popularmente conhecido.

Nos últimos dias, ganhou destaque no cenário nacional a discussão sobre a possibilidade de penhora de imóvel do fiador, reconhecido como “bem de família”, quando a fiança é prestada em contrato de locação, tanto de natureza residencial quanto de natureza não residencial.

A fiança prestada por pessoa física tem caráter pessoal, acessório ao contrato de locação e subsidiário (a depender da previsão do contrato), exceto nos casos em que houver renúncia de forma expressa ao benefício de ordem. Não é necessário que o locatário e o fiador possuam algum vínculo familiar, mas normalmente as exigências apresentadas por proprietários e imobiliárias para que o candidato a fiador seja aceito não são poucas.

Para que seja atestada a idoneidade patrimonial e pessoal do pretenso fiador, a  grande maioria dos proprietários ou imobiliárias exige a comprovação de renda (com a apresentação de cópia do recibo e da declaração de Imposto de Renda, ou de últimos holerites), cópia dos documentos pessoais (inclusive da certidão de casamento, se casado for), comprovante de residência, certidão negativa de registro de pendências financeiras (SPC/Serasa/Protestos) e apresentação de cópia de documentos de veículos e de imóveis de propriedade do fiador e de seu cônjuge, se houver.

O tema da penhorabilidade do bem de família para execução de obrigações decorrentes de fiança locatícia já estava pacificado no Judiciário por causa dos julgamentos do Recurso Extraordinário 605.709/SP (julgado em 2018) e, posteriormente, do Recurso Extraordinário 1.307.334 (julgado em 2021), estando prevista também no Tema 295 do STF e na Súmula 549 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), reconhecendo a validade da penhora do bem de família do fiador no caso de fiança prestada em contrato de locação de imóveis.

Contudo, a partir do julgamento do RE 605.709/SP na Primeira Turma do STF, em votação apertada, foi adotado entendimento no sentido de que a dignidade da pessoa humana e a proteção ao bem de família impediriam a penhora do bem de família do fiador em locação comercial, suscitando também a possível quebra da isonomia, em virtude do tratamento jurídico díspar entre locatário e fiador.

Frente à distinção estabelecida neste julgamento para os contratos de locação comercial em relação ao precedente geral anteriormente pacificado, alguns tribunais passaram a, gradativamente, modificar seus entendimentos sobre o tema, gerando maior instabilidade jurídica.

​A recente decisão do STF no julgamento do RE 1.307.334 coloca uma pá de cal sobre o assunto e sedimenta o entendimento em prol da penhorabilidade do bem de família, seja na locação residencial, seja na locação comercial.

​Muito embora a decisão traga mais segurança aos locadores, principalmente de imóveis comerciais, robustecendo o instituto da fiança no âmbito locatício, na prática, é provável que o posicionamento do STF desestimule as pessoas a figurar como garantidoras nos contratos de locação. Um provável efeito é a diminuição da adesão a tal espécie de garantia em face do elevado risco envolvido para o fiador. Fechar contrato de locação, ficará, portanto, um pouco mais burocrático para todas as partes.

Heloíse Jory é advogada especialista em Direito Imobiliário.

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