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O impeachment a jato do presidente paraguaio Fernando Lugo pegou a diplomacia brasileira desprevenida. O Itamaraty se deu conta, aparentemente pelos jornais, de que o companheiro Lugo estava prestes a perder o emprego. Enquanto nossa diplomacia se recuperava da surpresa, o Senado paraguaio confirmava a decisão da Câmara – que impediu Lugo pelo esmagador placar de 80 a 1 –, ratificando o impeachment por 39 a 6 votos. Sem apoio popular (além do apoio dos sem-terra), militar, jurídico ou político, Lugo não teve alternativa a não ser voltar para casa.

Desde o Barão do Rio Branco a diplomacia brasileira era conhecida e respeitada pelo seu profissionalismo. Isso começou a mudar em 2003, com a posse de Lula, que deu viés ideológico à condução da política externa e permitiu a interferência de amadores com forte engajamento ideológico, como o notório Marco Aurélio Garcia, nos rumos da diplomacia brasileira, muitas vezes em prejuízo dos interesses nacionais.

Caso emblemático foi a encampação militar de refinarias da Petrobras na Bolívia em 2006, por Evo Morales, que recebeu tratamento extremamente compreensivo por parte do governo brasileiro. Em contrapartida, um suposto golpe direitista em Honduras, em 2009, produziu um surto de onipotência imperialista no ex-presidente Lula, que passou a exigir que Manuel Zelaya fosse reconduzido ao poder mesmo depois de ter sucessor eleito em eleições livres e diretas.

Dilma Rousseff tem moderado o ativismo do antecessor. Tanto no trato com os aiatolás atômicos do Irã quanto no intervencionismo em países latinos. Ainda assim, o critério da afinidade ideológica continua suplantando o do interesse nacional. O próprio Lugo foi beneficiário desse viés diplomático. Graças à benevolência brasileira, conseguiu renegociar o Tratado de Itaipu, triplicando o preço pago pelo Brasil pela energia paraguaia gerada pela hidrelétrica. Uma cortesia que será paga pelo contribuinte brasileiro e que foi a maior, senão a única, realização positiva de Lugo em quatro anos como presidente do Paraguai.

A renegociação foi aceita pelo Brasil sem que os paraguaios nos dessem qualquer contrapartida. O governo brasileiro não pediu sequer que o governo Lugo parasse de dar respaldo e apoio aos carperos (os sem-terra paraguaios) que aterrorizam os brasiguaios, imigrantes brasileiros que tornaram o Paraguai um dos grandes produtores mundiais de soja. Foi a cobertura que Lugo deu a esse movimento e seus excessos, aliás­, que acabou provocando sua queda. O massacre de 17 pessoas, entre sem-terra e policiais, em Curuguaty, ocorreu, em boa medida, por causa do apoio, aberto ou dissimulado, que Lugo deu, nos últimos anos, aos carperos e aos radicais infiltrados no movimento.

Agora, para punir o Paraguai pelo impeachment de Lugo, o Brasil se une a democracias "exemplares", como a Venezuela e o Equador, para deixar o país "de castigo", suspenso do Mercosul até a próxima eleição presidencial. Vale notar que essa atitude ignora, mais uma vez, os brasiguaios – que fizeram um apelo dramático para que o governo Dilma reconhecesse o novo governo paraguaio. A afinidade ideológica novamente falou mais forte.

A diplomacia brasileira, que não antecipou a crise paraguaia e que não fez gestões eficazes para proteger os brasiguaios, precisa reencontrar o caminho da prioridade do interesse nacional em sua política externa. E precisa respeitar a legitimidade dos deputados e senadores paraguaios que foram eleitos pelas urnas e pela vontade popular.

Ademar Traiano, deputado estadual pelo PSDB, é líder do governo na Assembleia Legislativa.

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