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| Foto: Ivan Amorim/Gazeta do Povo

Embora o modelo de parcerias público-privadas como o conhecemos hoje tenha surgido apenas em 2004, no primeiro mandato de Lula, a ideia de utilizar a iniciativa privada para desenvolver projetos de interesse público é bem mais antiga. No Brasil, especificamente, data de meados do século 19, quando o Visconde de Mauá se valeu de incentivos do governo do imperador dom Pedro II e construiu, com recursos próprios, a primeira ferrovia nacional, a Estrada de Ferro Mauá.

É claro que, desde então, o país evoluiu muito. No entanto, guardadas as devidas proporções, é possível traçar um paralelo entre os tempos do Império e os de hoje, mostrando que, neste período, alguns problemas se perpetuaram e outros surgiram.

O modelo no qual o parceiro privado entra com a infraestrutura e a operação do serviço, sendo remunerado pelo Estado, é interessante e eficiente. Se bem pensado e aplicado, pode aumentar os investimentos em infraestrutura em setores-chave, como saúde, educação e transporte. Estas parcerias são, de forma geral, um caminho interessante e importante para o crescimento do Brasil.

Num cenário mais amplo, os contratos que o Brasil teve até aqui foram estruturados para proteger os investidores por longos períodos, de 30 anos ou mais. Só que, infelizmente, estas parcerias, as primeiras, tiveram algumas falhas, principalmente por causa de atitudes incompatíveis com a modalidade de contrato, provocadas por mudanças em governos, secretarias, capacidade orçamentária ou até por falta de vontade política.

Ou os contratos são melhores ou simplesmente a PPP não vai dar certo

Não faltam relatos de projetos com problemas de recebimento em função de decisões unilaterais quanto ao não pagamento do valor previsto. O investidor, por sua vez, não tem nada a ver com isso; afinal, aplicou milhões almejando o retorno estimado no plano original.

Por mais que os atuais contratos tragam dispositivos para garantir essa contrapartida, não é o que acontece na prática. Há, por exemplo, a figura do verificador independente, que na teoria é excelente e fica responsável por checar se ambas as partes cumpriram o que lhes cabia no acordo. Porém, o que acontece quando o governo não nomeia esse verificador?

Há, ainda, a previsão de execução de garantias, caso haja algum problema ou falta de pagamento. Contudo, quando essas garantias são realmente necessárias, esses dispositivos não funcionam, e os empresários se veem obrigados a recorrer à Justiça, em longos processos.

Na prática, tal quadro se reflete na criação de poucas (e cada vez menos) parcerias público-privadas, ou ainda em acordos que são ineficientes para ambos os lados e para a população.

Por isso, precisamos repensar diversas características das PPPs. Ou os contratos são melhores ou simplesmente não vai dar certo. São necessárias regras mais rígidas para os governos que não cumprirem com suas obrigações, além de garantias reais e líquidas aos parceiros, como as do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), que parecem ser as mais seguras. Os investidores não podem depender da boa ou má vontade das equipes políticas que vão se suceder e se alternar ao longo do período dos contratos.

Esses projetos não são de um político, mas sim de um estado, de um município, de toda a população. Não pode mais existir o velho lugar comum do “la garantia soy yo”.

Por experiência própria, é possível dizer que os problemas são persistentes e graves. Em alguns casos, a saúde financeira da empresa é suficientemente boa para segurar os impactos e continuar crescendo à revelia dos incidentes de pagamento. No entanto, nem todos os empresários brasileiros que poderiam contribuir ou que contribuem para o crescimento nacional são capazes de dizer o mesmo. Por isso, muita gente competente prefere não se arriscar nesse tipo de parceria, ou por receio, ou por ainda estar passando por grandes dificuldades com as já existentes.

O Brasil merece um destino melhor – e não há momento mais adequado para iniciá-lo do que agora.

Philippe Enaud é CEO e fundador da Vivante, especializada na gestão de facilities e que participa de cinco projetos de parcerias público-privadas na área de saúde no Brasil.
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