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A Constituição exige previsibilidade no aumento da carga tributária de IPI, de modo que se aguarde ao menos 90 dias entre a data da publicação da medida e o momento em que efetivamente poderá ser cobrada

A publicação do Decreto 7.567, que aumentou em 30 pontos porcentuais o imposto sobre produtos industrializados (IPI) na importação de veículos, fez com que tal taxa alcançasse o seu valor máximo previsto em lei. A medida visou, sobretudo, frear ou arrefecer a importação de produtos chineses, mais baratos que os carros nacionais e que vinham rapidamente obtendo crescente consumo, em detrimento dos veículos produzidos no Brasil.

Assim, a despeito da alegação dos importadores (Abeiva) de que ocupam apenas 5,79% do mercado nacional de veículos, o governo temia que os carros produzidos no Brasil perdessem espaço significativo para os produtos chineses mais baratos e, como consequência, que a indústria nacional fosse obrigada a demitir parte de seus funcionários, de maneira que se justificaria o eufemismo utilizado pelo governo de que estaríamos "exportando empregos". Essa manobra tributária também deseja forçar que essas empresas façam investimentos para instalar fábricas no Brasil, o que geraria empregos e riquezas no país de forma mais consistente.

Em que pesem todas estas questões macroeconômicas e sociais envolvidas, não há motivo que justifique se ignorar o comando da Constituição de que se dê tempo aos importadores de veículos de se preparar economicamente para o impacto financeiro que a medida causará e para que avaliem suas estratégias de negócios. Desde a Emenda Constitucional 42/2003, a União está obrigada a evitar o susto comum aos contribuintes que tem seus impostos aumentados de forma repentina. Desde 2003, tal emenda exige que esse imposto (a despeito de seu alto teor de extrafiscalidade) esteja submetido ao princípio da noventena, ou anterioridade nonagesimal. Dito de outro modo, a Constituição exige previsibilidade no aumento da carga tributária deste imposto, de modo que se aguarde ao menos 90 dias entre a data da publicação da medida que anunciou a alíquota maior e o momento em que ela efetivamente poderá ser cobrada, permitindo-se um planejamento financeiro para suportar o aumento da exação. No caso do aumento do IPI sobre veículos importados, o valor só poderia ser cobrado validamente em 16/12/2011, quando superado estará o prazo que a Constituição exige de inércia do governo, antes do início da cobrança do aumento deste imposto.

No entanto, o governo federal se impacienta e ignora solenemente o comando constitucional, alegando que o dispositivo da Constituição que prevê tal garantia se refere ao momento da publicação da lei que criou o imposto e não do decreto que o aumentou. No caso do IPI, seria do momento em que foi publicada a lei que criou essa exação, de modo que, segundo seu entendimento, não precisaria respeitá-lo agora no aumento de alíquota via decreto.

É flagrante a discrepância entre o agir do governo e a determinação constitucional, que só será corrigida mediante tutela jurisdicional para fazer valer o princípio que procura evitar surpresas desagradáveis e insegurança para a economia e seus agentes. É notadamente importante para as importações em curso, dado que o importador em regra não pode desfazer a importação iniciada, e a Fazenda Nacional já está exigindo, no momento do desembaraço aduaneiro, o incremento do imposto contido no decreto.

Interessante que o mais comum em situações como essas seria a União aumentar o imposto de importação e não o IPI, inclusive porque este imposto tem a arrecadação dividida com estados e municípios, já que compõe seus respectivos Fundos de Participação (FPE e FPM) e, sobretudo, porque deixou, desde a mudança da Constituição, de contar com a principal característica dos tributos que servem com eficiência como instrumentos para implementar políticas aduaneiras e industriais no Brasil, que é a sua celeridade. Queira o governo ou não, deverá aguardar pacientemente os 90 dias da sua vacância legal.

Alexsander Roberto Alves Valadão, professor Adjunto da PUCPR, é advogado, mestre e doutor em Direito Tributário pela UFPR.

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