• Carregando...
 | Antonio Cruz/Agência Brasil
| Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Passados os primeiros impactos da eleição presidencial e de um segundo turno em que os debates tornaram-se mais acalorados entre os seguidores dos dois candidatos, assim como frequentes as acusações, principalmente do candidato derrotado contra o perfil do vitorioso, pode-se fazer uma análise mais serena do pleito e das razões da vitória de um deputado que, um ano atrás, ninguém poderia imaginar como futuro presidente da República.

O primeiro aspecto a destacar na sua vitória foi a clareza de sua posição. Declarou-se, desde o início, contra a corrupção; contra o empreguismo burocrático; contra a “canonização” de marginais, à luz de uma incorreta visão do que sejam direitos humanos; a favor da proteção de cidadãos do campo, de caminhoneiros, de pessoas que vivem nas regiões dominadas por facções criminosas conhecidas, com “direito” a porte de arma; mas, principalmente, na defesa de valores familiares e princípios morais. Manifestou-se, também, a favor da inserção do país na globalização da economia, com teses do século 21, e não com teses mais próximas do século 19, em que o conflito de classes e o assistencialismo sem horizontes para o beneficiado constituíam o fulcro da propaganda de seu adversário.

Seu discurso, sempre o mesmo, foi destinado a um povo cansado da velha política e da corrupção que reinou no país, mormente nos 13 anos de governo do partido de seu opositor. O eleitorado, ao dar-lhe uma vantagem de 11 milhões de votos – número equivalente à população de Portugal –, mostrou que suas teses tiveram repercussão.

O erro maior do partido derrotado foi não ter reconhecido que alguns de seus próceres geraram os maiores escândalos de corrupção do mundo

O segundo aspecto foi a falta de percepção por parte do candidato derrotado de que, nas grandes democracias, quando se assaltam as contas públicas, os culpados fazem uma mea culpa, são afastados do partido para não prejudicá-lo, pedem desculpas ao povo, e o partido segue sua trajetória. Exemplos recentes tivemos no Japão, Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos.

O erro maior do partido derrotado foi não ter reconhecido que alguns de seus próceres geraram os maiores escândalos de corrupção do mundo, o mensalão e o petrolão. Mais do que isto: procuraram justificar-se atacando os poderes constituídos, considerando “políticas” decisões exclusivamente jurídicas da magistratura – no caso do presidente Lula, foram 16 magistrados que mantiveram sua pena: um juiz de primeira instância, três desembargadores de segunda instância (no TRF-4), cinco ministros do STJ e seis ministros do STF –, assim como conclamando notórios violadores de princípios constitucionais (invasores de prédios públicos e privados e de áreas rurais) a defenderem, com seus métodos ilegais, a reconquista do poder que antes detiveram. Além disso, enquanto disseminaram suspeitas de que o candidato eleito pudesse representar uma ameaça à democracia, a presidente de seu partido continuou elogiando reconhecidos ditadores como Nicolás Maduro, Daniel Ortega e velhos e novos dirigentes de Cuba, como se fossem autênticos democratas.

À evidência, a militância prestou vênia à convocação, mas não o povo, que elegeu o candidato contrário a tal maneira de fazer política.

Leia também: Uma chance para a pauta liberal (editorial de 4 de novembro de 2018)

Leia também: Quem elegeu Bolsonaro? (artigo de Adriano Gianturco e Lucas Azambuja, publicado em 4 de novembro de 2018)

O terceiro aspecto é que os outros candidatos (Geraldo Alckmin, Ciro Gomes, Henrique Meirelles e Marina Silva) não definiram corretamente seus discursos na campanha. Alckmin atacou o adversário errado – Bolsonaro, em vez de Haddad; Ciro tentou atrair o PT e depois contestou o partido; Meirelles teve um discurso correto, mas técnico demais para a compreensão do povo; e Marina continuou lembrando Tom Jobim, no seu samba de uma nota só. Apesar de terem dinheiro, espaço na televisão e força partidária, foram vencidos por uma candidatura sem dinheiro, sem partido, sem tempo de televisão, e que teve contra si, no segundo turno, parte considerável da imprensa e quase toda a força política daqueles que dirigiram a nação desde a promulgação da Constituição de 1988.

Exceção representou o Partido Novo, que, sem recursos e com uma proposta nova e sem outra intenção que não a de marcar posição, viu seu candidato alcançar expressiva votação, além de eleger governador para o segundo maior colégio eleitoral do país.

Creio que os políticos terão, a partir de agora, de repensar suas estratégias fracassadas e, principalmente, seus estilos ultrapassados e condenáveis de fazer política. O velho Brasil parece ter sido enterrado, nestas eleições.

O que desejamos é que o candidato vitorioso seja bem-sucedido, para o bem do Brasil, muito embora tenha de mostrar competência, cumprir suas promessas e suportar todos os que lhe farão oposição na esperança de que possam voltar àquele Brasil condenado pelos eleitores em 28 de outubro.

Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifeo e UNIFMU, das escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1.ª Região, presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomércio-SP, e fundador e presidente honorário do Instituto Internacional de Ciências Sociais (Iics).
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]