• Carregando...

Na educação brasileira, o grande de­­sa­­fio reside na falta de com­­­petência, no limitado compromisso com o bem comum

O Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) foi tema de debate nas últimas semanas. A ideia de realizá-lo não é recente, nem constitui novidade brasileira. Sob diversas formas, países – em especial europeus – o realizam, avaliando a qualidade e a suficiência do ensino pré-universitário.

No entanto, sem inscrever-nos no contexto atribulado e grotesco desse cenário diversificado de opiniões, é importante avaliar os números que decorrem do recente Programa Inter­­­­nacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) que, ao medir resultados de 57 países, colocou-nos em 52.º em Ciências, em 54.º em Matemática e em 50.º em leitura.

De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil ainda tem mais de 10% de analfabetos totais contra 2,3% da Argentina. Enquanto em nosso país são só 21,9% os jovens com alguma educação pós-secundária, no Uruguai eles são 44,6%. No modesto Panamá, 45% acessam o ensino superior. Aqui, esse número se limita a 30%.

Pior que isso: nossa taxa de abandono escolar é de 24%. No Chile, é de apenas 5,1%. Os indicadores de repetência escolar brasileira vão a 18,7%. No Peru, elas são de 7,2%.

Se o Brasil, no Índice de Desen­­­volvimento Humano (IDH) geral fica em 73.º lugar – o que é ruim –, no IDH-Educação especificamente cai para 93.º lugar – o que é péssimo –, atrás da Guiana (85.º) e de Botswana (85.º), por exemplo.

Há de se ponderar, por outro lado, que nosso país está gastando 5,2% de seu Produto Interno Bruto (PIB) em educação, conforme dados oficiais, enquanto a Austrália, segunda colocada no IDH, consome 4,7% e a poderosa Alemanha, décima no mesmo ranking, 4,4%. Logo, tem-se mais recursos e obviamente aplica-se mal.

O problema da educação no Brasil é a qualidade. No caso específico do Enem chega a ser vergonhoso ver novamente o fracasso do exame, que mostra em seu histórico tropelias e trapalhadas incluindo desde o vazamento das provas, divulgação de gabarito errado e até alteração da data de aplicação do teste. Além dos problemas na folha de respostas e erros no número de inscrição impresso nas provas.

Fica claro, pois, que na educação brasileira o grande desafio reside na falta de competência, no limitado compromisso com o bem comum e até na discutível probidade de muitos responsáveis por tão importante área da vida societária.

Lendo e relendo os números mencionados, os porcentuais educacionais lastimáveis que desfilam, mesmo quando comparados com países tidos como subdesenvolvidos, vemos que nossa euforia, por termos o 5.º mercado mundial de telefonia celular, sermos o 7.º maior credor em reservas internacionais ou de produzirmos 3 milhões de automóveis por ano, deve ser realista e contida.

Não adianta, como na história-lenda de Nabucodonosor, na Babilônia, construir a enorme estátua de cabeça de ouro e braços de prata, se os pés forem de barro.

Dependendo de um ponto de vista mais crítico e cidadão, não se deve aceitar que a própria cabeça seja de barro. É por tudo isso que as falhas, os defeitos e até as mazelas lamentáveis e repetidas na execução do Enem não chegam a surpreender. Obviamente, são efeitos previsíveis de maléficas causas conhecidas.

Carlos Alberto Chiarelli é ex-ministro da Educação, doutor em Direito e presidente da Associação da Cadeia Produtiva de Educação a Distância.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]