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O 1.º de maio terá mais um verbete nas enciclopédias, a aludir o ocaso da primeira grande organização terrorista da era da globalização, sufocada com o desaparecimento da liderança inconteste de seu mítico fundador

Poucos eventos históricos tiveram impacto tão intenso e imediato na vida internacional e na percepção do comun das pessoas como o colapso causado pelo ataque às Torres Gêmas: onde você estava em 11 de setembro de 2001?

Agora, com o anúncio do presidente norte-americano, em pleno domingo de início de primavera nos Estados Unidos, de que Bin Laden está morto, reaviva-se o espectro do perigo terrorista, que mata de forma insidiosa e imprevisível.

A par de razões de natureza ideológica, se favoráveis ou contrários aos Estados Unidos, em qualquer circunstância é imponderável que se justifiquem ações violentas e indiscriminadas, em um mundo que se propõem cada vez mais à negociação e ao diálogo. Em que pesem os recorrentes adeptos das vertentes conspiratórias, ainda céticos sobre a ida do homem à Lua, ou aos recorrentes episódios de antiamericano hormonal, a semana começou com justificável júbilo. Não apenas nos governos ocidentais, a iniciar pelo pronunciamento do premier conservador britânico David Camerun, ainda sob os eflúvios do casamento do príncipe. Em menos de 48 horas, as redes mundiais passaram dos devaneios do mundo irreal para a nudez cruel da verdade, da violência globalizada, que alega matar por alguma culpa imprecisa dos que haverão de morrer.

Em contexto delicado para as relações com os países islâmicos, por mais que a ação militar tenha sido de países muçulmanos e dos serviços de inteligência de Islamabad, a morte de Bin Laden conflagra o que já era particularmente explosivo. A crise das ditaduras islâmicas e de suas espúrias relações com o ocidente, hoje colocada em xeque pelo grito das ruas de populações irridentas, é em certa medida a repetição do que foi o item político do fundador de Al Qaeda. Primeiro, a colaboração ostensiva por todos os meios, lícitos ou não, com a Casa Branca. Depois, a execração e o repúdio, até as ações de reciproca violência furibunda, coroadas pelas ações terroristas espectaculares.

Em todo esse contexto de acirramento de posições, que chegam a colocar em xeque a unidade da Europa, como vimos no recente entrevero diplomático ítalo-francês, sem que se tenha ademais definido o destino da Líbia e da Síria, o choque de civilizações e a reconstrução da ordem mundial de que favava Samuel Huntington, em seu profético artigo em Foreing Affairs, em 1993, parece a cada dia mais atual e imponderável.

Embora os fatos históricos não possam ser reconhecidos de imediato, há, no entanto, certos eventos que dispensam o distanciamento e a valoração à posteriori. Não parece exagero afirmar que o 1.º de maio terá mais um verbete nas enciclopédias, a aludir o ocaso da primeira grande organização terrorista da era da globalização, sufocada com o desaparecimento da liderança inconteste de seu mítico fundador.

Apenas horas decorridas do anúncio da Casa Branca, feita em pessoa pelo presidente dos Estados Unidos, também candidato declarado às próximas eleições, resta a dificuldade de mensurar o efeito e o alcance da notícia na política interna norte-americana. Uma façanha de feição e de musculatura republicana, mas que ao contrário da policy dos falcões foi realizada com cérebro e com discrição.

No plano mundial, esperam-se os desdobramentos políticos da façanha militar americana, da qual a propaganda e a contrapropaganda deverão agir fragorosamente. Em particular nos governos islâmicos não hostis ao Ocidente, bem como nas relações de cooperação que se iniciaram o entre os palestinos de Hamas de outros partidos.

Diante da rigidez do fundamentalismo religioso que ainda alimenta substancial parte da cultura norte-americana, que celebra o acontecimento como retalhação inevitável, pelos órfãos do terrorismo e pela honra da nação, não muito distante do fanatismo suicida dos soldados de Bin Laden, resta sempre a palavra eterna de Gandi: "Se os povos aplicarem a lei do olho por olho, a únca coisa que ocorrerá é que todos acabarão cegos."

Jorge Fontoura, professor titular do Instituto Rio Branco, é presidente do Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul.

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