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Há certas pessoas que, quando falam, nos inebriam com sua sabedoria e a beleza de suas construções verbais. É reconfortante ler a entrevista do cientista político português João Pereira Coutinho concedida às páginas amarelas da revista Veja de 1.º de outubro. Eu já houvera lido algumas referências elogiosas à inteligência desse jovem intelectual de apenas 38 anos, e sabia que mesmo aqueles que pensam o oposto dele reconhecem sua genialidade.

Coutinho é um pensador que, em face da imperfeição humana, sugere que os políticos devem ter seus poderes limitados e controlados, afirma ser ingenuidade buscar salvadores da pátria e vê o governo como um ente incapaz de resolver os problemas que os políticos prometem resolver. Ele também condena a atitude infantil da sociedade em buscar as soluções de todos seus problemas no Estado, como se as pessoas fossem crianças incapazes de decidir e lutar por si mesmas.

É desejável que o governo tenha bons programas sociais para melhorar a distribuição da renda e reduzir a pobreza. Isso é óbvio. Porém, Coutinho não entende como nós, brasileiros, desconfiamos dos políticos, achamos que em sua maioria eles são incompetentes e corruptos, mas apesar disso vivemos pedindo mais governo e mais Estado. Gritamos nossa indignação contra a corrupção infernal com dinheiro público enquanto continuamos elegendo os corruptos, os antigos e os novos.

Gilberto Amado dizia que ficava eufórico quando encontrava um brasileiro capaz de ligar causa e efeito. Na prática, vivemos dissociando uma coisa da outra. Roberto Campos, descrente do Estado, em relação à corrupção afirmava: "Em sendo impossível mudar a natureza do pecador, cumpre reduzir as oportunidades de pecado", para dizer que a única forma de diminuir a corrupção no Brasil é diminuir o tamanho do Estado.

Na entrevista de Coutinho, há uma passagem tão bem elaborada que merece ser transcrita. Respondendo à pergunta sobre a afirmação da presidente Dilma de que algumas pessoas são virtuosas, logo, as instituições têm de ser virtuosas, ele disse: "A noção de que há pessoas perfeitas e instituições idem é uma atitude própria de quem está apaixonado por si mesmo. É um sentimento que predomina normalmente no fim da adolescência. Um dos problemas atuais é que algumas pessoas sofrem de adolescência tardia, creem que têm toda a razão, que o mundo está errado e deve se submeter a seus caprichos. Um tirano nada mais é que uma criança que não aceita o não como resposta. Aqueles que se acham perfeitos têm problemas de desenvolvimento. Nunca questionam suas certezas e por isso oferecem um grau de periculosidade muito alto".

O amor que os povos da América Latina nutrem pelo Estado e a esperança de que o governo pode salvar a todos da pobreza é algo esquizofrênico. As incoerências são muitas, inclusive em assuntos políticos. Há esquerdistas famosos que vivem exigindo o julgamento de ditadores, enquanto se dedicam a louvar o ditador Fidel Castro, um matador notório. Para essa gente, se o ditador for de direita, deve ser condenado; se for de esquerda, deve ser louvado. Isso é coisa de fanáticos.

A coerência é a virtude de comportar-se com lógica igual diante de fatos iguais. É uma virtude rara, que os fanáticos, em geral, não têm.

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.

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