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A política de valorização do salário mínimo e a disseminação do programa oficial de transferência de renda, denominado Bolsa Família, propiciaram a subida dos patamares de crescimento econômico do país

Os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro do 1º trimestre de 2009 comprovam que, ao contrário do que foi apregoado pelas autoridades econômicas e por parte das lideranças políticas e empresariais, o colapso das finanças mundiais atingiu o país. Lembre-se de que a gênese do processo aconteceu em agosto de 2007, com a quebra do segmento hipotecário de 2ª linha dos Estados Unidos (EUA), e cresceu com a sucessão de falências de instituições financeiras e de anúncios de prejuízos recordes por companhias multinacionais, a partir de setembro de 2008, culminando com o pedido de concordata da General Motors (GM), em junho de 2009.

Sem pedir licença, a instabilidade externa travou as linhas de crédito, encolheu a demanda e depreciou as commodities em escala planetária, abortando o maior ciclo de crescimento da economia mundial depois da 2ª Guerra e a etapa ascendente da produção e dos negócios no Brasil, começada em 2004, em resposta ao ambiente exógeno favorável, e consolidada, de maneira virtuosa, após o 2º semestre de 2005, com o alargamento do mercado interno.

De fato, ao lado dos impulsos externos, a flexibilização monetária – conjugando queda nos juros e ampliação dos prazos de financiamento das compras de bens duráveis, e a proliferação da modalidade de crédito em consignação, com desconto na folha de salários dos trabalhadores –, a elevação da massa de rendimentos (emprego e proventos reais), a política de valorização do salário mínimo e a disseminação do programa oficial de transferência de renda, denominado Bolsa Família, propiciaram a subida dos patamares de crescimento econômico do país. Tanto é assim que a variação média do PIB brasileiro saltou de 2,3% ao ano, no intervalo 1994-2003, para 6,0% a.a. entre 2004 e 2008.

Mas esse ambiente positivo ficou para trás. Mais precisamente, a recuperação dos níveis de atividade, trilhada desde 2004, foi abortada pela instantânea e pronunciada penetração do default internacional no território nacional, inaugurando, de forma patética e prática, uma situação de recessão técnica por essas paragens, atestada pela queda dos principais indicadores do nível de atividade.

O PIB declinou 3,6% e 0,8% no último trimestre de 2008 e no 1º de 2009, respectivamente, em relação aos períodos imediatamente anteriores. Em escala mundial, as contrações mais intensas, na mesma base de cotejo, aconteceram na Letônia (-28,7%), EUA (-5,7%), Japão (-4,0%), Alemanha (-3,8%), Zona do Euro (-2,5%), Itália (-2,4%), Espanha (-1,9%), Reino Unido (-1,9%) e França (-1,2%). Mas, o fato mais relevante foi o decréscimo de 1,8% diante do mesmo intervalo de 2008 (-1,5% do PIB a preços básicos e –3,3% dos impostos).

Por um exame setorial, a compressão foi determinada pela indústria (-9,3%) e agropecuária (-1,6%). Nos serviços, houve registro de incremento de 1,7%, puxado por outros serviços (+7,0%), intermediários financeiros (+5,8%) e informação (+5,4%, telefonia e informática). Em outros serviços, estão inclusos aqueles prestados às empresas e famílias, como saúde e educação privada, alojamento e alimentação, associativos, domésticos e manutenção e reparação. Cabe sublinhar ainda os decréscimos verificados no comércio (-6,0%) e em transporte e comunicações (-5,6%), reflexos diretos da retração econômica.

Em confronto com o 4º trimestre de 2008, os gastos de consumo das famílias e do governo aumentaram 0,7% e 0,6%, respectivamente e, na parte externa, as exportações caíram 16,0% e as importações 16,8%. Em paralelo, a formação bruta de capital fixo retraiu 12,6%, representando o pior resultado desde 1996, o que fez a taxa de investimento descer para 16,6% do PIB, contra 18,4% do PIB nos primeiros três meses de 2008, evidenciando apreciável comprometimento da capacidade de modernização e expansão de longo prazo do país.

Tal desempenho agregado brecou 21 trimestres sucessivos de expansão, observados entre 2003 e 2008, de acordo com cálculos do Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace), do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ademais, a produção industrial diminuiu 14,7% nos quatro primeiros meses de 2009, o pior comportamento desde 1991, e, segundo sondagem da Confederação Nacional da Indústria (CNI), as vendas reais, as horas trabalhadas e o emprego industrial caíram 8,4%, 7,7% e 2,0%, respectivamente, no mesmo período.

Gilmar Mendes Lourenço é economista e coordenador do Curso de Ciências Econômicas da FAE Centro Universitário.

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