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Agência Brasil
| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

Os meios especializados brasileiros vêm identificando a formação de um paradoxo entre a generalizada melhora dos indicadores de confiança dos atores sociais, apurada por pesquisas mensais realizadas por entidades de classe, e a prevalência de uma espécie de letargia na atmosfera produtiva.

Essa anomalia repousa em fatores objetivos, intimamente atrelados à evolução da política econômica, demasiadamente centrada na predominância das intenções sobre as providências concretas; às inquietações dos agentes quanto ao preço a ser pago para os reparos dos enormes estragos causados pela aplicação de uma propagandeada nova matriz econômica, entre 2008 e 2015; e ao retardo temporal da reprodução da reversão da apatia geral no cotidiano das decisões de produção, consumo e investimento.

A despeito da convicção de o estágio atual expressar o fim da cavação do buraco e a vagarosa saída do fundo do poço, o funcionamento do aparelho econômico traduz insuficiente convencimento a respeito da formação de aspectos propícios à mudança de sinal das variáveis de estabilização e expansão, incitada pela equipe econômica do governo Temer, especificamente o Ministério da Fazenda e o Banco Central (BC).

Um complicador adicional reside no desenho da política econômica dos Estados Unidos sob a gestão Trump

Mais precisamente, a restauração da disciplina estrutural das finanças públicas representa uma promessa, subordinada à aprovação e aplicação da Proposta de Emenda Constitucional 55 (ex-241), que atrela a evolução dos gastos primários da União à inflação nos próximos vinte anos contados a partir de 2017; e da tramitação e aprovação, pelo Congresso, da reforma da Previdência. Elas proporcionarão a interrupção do incremento da relação dívida pública/PIB de 2018 em diante, em uma pressuposição otimista.

Ao mesmo tempo, a iniciativa do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, em reduzir a taxa Selic de 14,25% para 14% ao ano, na reunião do fim de outubro de 2016, exibiu uma conotação mais cosmética e menos efetiva, enquanto profundas modificações no modus operandi do sistema financeiro e na sistemática de cobertura das necessidades de financiamento do setor público não abrirem flancos para a compressão estrutural do custo do crédito no país e fornecerem novo fôlego para o consumo e o regresso do investimento.

Logo, em um contexto de não criação de circunstâncias propícias ao aparecimento de múltiplos motores da recuperação da economia brasileira, além do agronegócio, resta assistir apenas à perda de intensidade do decréscimo dos componentes do eixo econômico e, em consequência, à ampliação do hiato negativo do PIB, que, por sinal, ao contrário do acontecido em 2012, reforça as circunstâncias desinflacionarias para a continuidade da redução dos juros.

Um complicador adicional reside no desenho da política econômica dos Estados Unidos sob a gestão Donald Trump, centrado na ativação de mecanismos dirigidos à ampliação do protecionismo, diminuição da carga tributária incidente sobre as empresas e expansão líquida dos dispêndios governamentais (acréscimo em infraestrutura e defesa e declínio em seguridade social), sem contar as insinuações de derrubada dos pilares das principais articulações comerciais globais. Tal postura, um autêntico maná para incursões especulativas, em circunstâncias de rota cadente do desemprego naquele país, forçará a elevação dos juros, valorização do dólar e pronunciado rearranjo das carteiras de ativos financeiros globais em favor do mercado norte-americano, o que deve comprimir e encarecer o financiamento internacional, sobretudo para as nações com finanças públicas bastante desequilibradas.

É interessante notar que durante anos os dirigentes brasileiros elegeram, equivocadamente, uma suposta crise internacional como a principal responsável pela multiplicação das mazelas domésticas. Nas circunstâncias atuais, não é difícil perceber a formação de uma apreciável perturbação de origem exógena.

Gilmar Mendes Lourenço, economista, é professor da FAE Business School e ex-presidente do Ipardes.
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