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Por que os fotógrafos fazem tantas fotos violentas? Essa é uma pergunta recorrente nas visitas à exposição da Fundação World Press Photo, em cartaz em Curitiba. Uma resposta simples seria a de que retratamos o mundo, portanto retratamos a violência. Porém, não é tão simples assim.

O mundo realmente esteve violento em 2005, ano em que as fotos expostas foram feitas, e continua assim desde então. A exposição apresenta a violência exponencial dos conflitos, da desigualdade retratada pelo percurso do diamante desde sua extração até o repouso encontrado na pele alva de uma senhora inglesa; das rosas do vestido da pequena menina que carrega em suas mãos o sangue fresco de seus pais; da desilusão do jornal esquecido embaixo do braço de um sobrevivente do atentado ao metrô de Londres.

Não são imagens privadas de calor. O dramatismo das situações pelas quais o planeta passou impõe-se por meio das fotografias, sejam elas da devastação causada por tufões e terremotos, pelo exato instante do chute que acerta o rosto de um jovem, ou pelos prisioneiros amontoados em uma cela na África do Sul.

Mas falar sobre fotografia ou escrever sobre ela significa, acima de tudo, se pronunciar sobre um poderoso meio de expressão e também alertar para o poder denunciante que a fotografia possui.

Com sua linguagem própria, a fotografia transcende barreiras na medida em que apresenta um conjunto de elementos que desvendam o cotidiano, as relações sociais, o homem e sua vida. A resposta, portanto, começa a ficar mais complexa. A violência retratada representa sim o mundo, e mais do que isso, as imagens formam um conjunto dos valores morais da concepção do mundo e da vida.

São histórias sistematizadas por um profissional que é muitas vezes também protagonista, já que decide de que maneira irá revelar os fatos. O repórter não é somente um observador do cotidiano, mas uma personagem que vivencia e que além de interpretar se sensibiliza com o acontecimento a tal ponto, que perpassa a lente um sentimento de humanidade e solidariedade com as pessoas.

E é nesse ponto que se delineia a resposta adequada para aquela pergunta: por que os fotógrafos fazem tantas fotos violentas?

O fotojornalismo parece ser o suporte mais adequado para mostrar esse mundo convulsionado pela agressão.

A imagem fixa transcende um mero testemunho casual. O conteúdo de alto valor informativo é um eloqüente e perturbante meio de denúncia, e os temas tratados de maneira tão tocante se transformam sob o olhar de um observador sensível em um apelo repleto de esperança.

Assim, as imagens das guerras, da revolta da natureza, da escola de balé, do desfile de modas, dos ex-combatentes, da fronteira das Coréias, da mulher que venceu o câncer, da seca no Brasil, dos incêndios em New Orleans, dos elefantes maltratados, dos jogadores viciados, da senhora que observa uma exposição, dos pintores chineses que dormem sobre seus quadros são um alerta sobre a necessidade de ações de solidariedade. São fragmentos de um mundo que a humanidade deve conhecer porque no mundo do homem há espaço para a violência e para a esperança. Esperança representada pela mesma Guatemala que, por exemplo, apresenta a cabeça decepada de um jovem delinqüente e logo ao lado revela a singeleza de um menino que carrega seu cão em meio à devastação provocada pela seca e dos dois amigos que no meio da mais profunda miséria exibem sorrisos infantis repletos de alegria, uma quase alegoria que grita: "Basta viver para ser feliz".

Ao percorrer a exposição da World Press Photo, o observador se depara com os olhos de uma jovem mãe africana. Se os olhos são a janela da alma, aquela alma se desnuda e encara cada transeunte, exigindo dele um posicionamento. Não é possível ficar amortecido diante das imagens expostas e é justamente por isso que os fotógrafos fazem tantas fotos de violência: é na esperança de que a violência, um dia, acabe.

Maria Zaclis Veiga Ferreira é jornalista, fotógrafa, pesquisadora na área de multimeios e professora de fotojornalismo do Unicenp - Centro Universitário Positivo.

Serviço: A World Press Photo 2006 vai até 29 março, na Sala de Eventos do Unicenp (Rua Prof. Viriato Parigot de Souza, 5.300), em Curitiba. De segunda a sexta a visitação vai até 21h; no fim de semana até 18h. A entrada é franca.

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