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Está na hora de voltarmos a ter o “grau de investimento”?
| Foto: Marcos Tavares/Thacom

O “grau de investimento” de um país reflete a qualidade do crédito soberano frente ao cenário global, destacando qualidades de solidez da economia nacional e pontos positivos na capacidade de crescimento e credibilidade. Assim, reflete a capacidade de um país de honrar suas dívidas. Infelizmente, já faz alguns anos que o Brasil perdeu seu “grau de investimento”, quando, em 2015, duas das principais agências de classificação de risco, a Standard and Poor’s e a Fitch, rebaixaram nosso rating para BB+ (a terceira agência, a Moody’s, tirou o “grau de investimento” do Brasil em 2016). Desde então, S&P e Fitch promoveram mais dois novos cortes para BB e BB-, em 2016 e 2018, distanciando-nos deste selo de “bom pagador”, a partir da piora da trajetória do déficit fiscal, da perda da credibilidade frente a credores e investidores, e do aumento crescente da insegurança política e jurídica.

Desde então, o Brasil tem sinalizado a conclusão de algumas medidas que tentam controlar a trajetória explosiva da dívida, sendo notáveis a lei do teto dos gastos e a reforma da Previdência. Tais fatos têm ajudado o país a sinalizar um comprometimento com seu ajuste fiscal e tentam resgatar a credibilidade junto ao cenário internacional, o que tem sido relevante para a trajetória dos preços dos ativos locais.

Neste sentido, um dos ativos que sinalizam uma melhora do apetite ao risco é o Credit Default Swap (CDS), um “seguro” para os investimentos no Brasil: quanto maior o nível desse ativo, maior o prêmio de risco necessário para “comprar Brasil”. Em 2015, o CDS brasileiro atingia as máximas recentes; hoje, após os acertos dos últimos anos, é negociado nos patamares de 2011, quando recebemos o melhor rating da história, em um sinal de melhora para a dinâmica dívida nacional.

O crescimento econômico, com controle inflacionário, continuará sendo um dos principais gatilhos para qualquer evento de grau de investimento

Entretanto, qualquer cético (ou realista) pode argumentar que, de 2011 para cá, muita coisa mudou no cenário global e local, e o movimento do CDS não é garantia do grau de investimento. Eles estão certos. Alguns pontos a destacar são o crescimento da relação dívida/PIB, o menor ímpeto do crescimento mundial, os eventos geopolíticos que afetam emergentes, a menor capacidade instalada, a queda nos investimentos, as famílias mais endividadas, o desemprego mais alto e a manutenção das incertezas.

Embora esta sensibilidade e dinâmica do mercado sejam importantes do ponto de vista de investimentos externos e credibilidade, não constituem uma certeza para as agências de risco em relação à concretude, no longo prazo, da sua constância e segurança. As agências ainda se mantêm cautelosas, principalmente após diversos eventos esperançosos em países emergentes terem sido abortados de maneira abrupta.

Assim, não se trata de uma discussão de mercado, mas sim de fatos que perduram ao longo do tempo, com segurança jurídica e política, melhorando a dinâmica fiscal nacional. Neste sentido, é preciso argumentar que o Brasil está mais longe do grau de investimento do que o mercado faz parecer, embora com possibilidades na revisão do rating para cima.

O Brasil sempre foi (e será) um turbilhão de ideias políticas relevantes, com alternâncias de poder bastante significativas. Este fato, para a credibilidade das políticas instituídas, é um risco bastante presente e continuará sendo relevante no horizonte de decisão das agências de risco. Embora o Congresso tenha conseguido aprovar reformas relevantes para o país no longo prazo, ainda teremos processos de difícil aprovação, que também são importantes para a questão fiscal. A melhora no entendimento entre as casas legislativas e o Executivo é um sinal relevante de avanço para o país.

Além disso, o país ainda apresenta contas fiscais bastante complicadas do ponto de vista de gestão da dívida no longo prazo, com custos de financiamento ainda relativamente altos na média (embora o Tesouro Nacional tenha se beneficiado da queda dos juros básicos e da troca de seu perfil de dívida) e arrecadação que ainda depende da melhora da atividade econômica.

O crescimento econômico, com controle inflacionário, continuará sendo um dos principais gatilhos para qualquer evento de grau de investimento. Neste sentido, o país ainda apresenta crescimento tímido e aquém do projetado. É preciso apresentar números concretos de crescimento para atrair capital externo e consolidar a credibilidade. Muito embora alguns dados estejam melhores na margem (expectativas, construção civil e serviço), ainda temos um longo caminho. Também é válido destacar a importância da ancoragem das expectativas inflacionárias pelo Banco Central, permitindo juros básicos estimulativos, o que ajuda a dinâmica da dívida, e no ambiente de investimentos/consumo para o PIB brasileiro.

Um cenário externo benigno tende a minimizar choques negativos para economias emergentes no que tange a: inflação, propensão marginal a riscos e influxos como investimento direto, maior propensão de investimentos e consumo, e política monetária expansionista. Entretanto, eventos como a guerra comercial entre Estados Unidos e China e desaceleração do crescimento global podem ter papeis importantes no médio prazo. Por outro lado, taxas de juros significativamente mais baixas no mundo são suporte importante.

Por fim, estamos três níveis abaixo do de grau de investimento em duas agências, e dois níveis abaixo na terceira; historicamente, embora não seja regra, as agências de risco não elevam as notas soberanas de maneira tão célere e em curto espaço de tempo.

Mesmo embora o grau de investimento demore um pouco mais, vários dos argumentos corroboram para a melhora do rating do país em período mais rápido. Por fim, é possível que o mercado esteja se adiantando mais do que parece crível em relação ao grau de investimento, com o CDS brasileiro a níveis bastante baixos.

Gustavo Rodrigues G. Andrade é economista e professor de Economia do Ibmec BH.

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