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Um dos serviços que os governantes militares prestaram à população foi extinguir o DCT e criar uma empresa alta­­mente profissionalizada

A infeliz saga dos Correios, às voltas com problemas de corrupção e apresentando uma clara deterioração dos padrões de serviços, é uma dessas coisas que desafiam as inteligências comuns, pois parecia impossível que alguns punhados de apadrinhados políticos colocados na direção da empresa, pudessem tão rapidamente destruir um patrimônio de credibilidade que levou quarenta anos para ser acumulado.

Para informação dos mais moços e lembrança dos mais velhos: até 1964, os serviços de correios no Brasil estavam a cargo do DCT, o Departamento de Correios e Telégrafos, cujo retrospecto de desídia, descontrole e ineficiência o havia transformado em uma piada de mau gosto. Telegramas de pêsames chegavam depois da missa de 1.º aniversário de morte do homenageado pela lembrança dos atenciosos amigos (ou depois do novo casamento da viúva),cartas eram perdidas sem cerimônia, a bagunça era total, absoluta, irrestrita e generalizada.

Um dos serviços que os governantes militares prestaram à população foi extinguir o DCT e criar uma empresa altamente profissionalizada, que foi buscar a melhor tecnologia postal no mundo inteiro. Não perderam tempo tentando "reformar" o DCT, nem "modernizá-lo": simplesmente jogaram fora o que existia e começaram do zero. Passados alguns anos, os Correios já apresentavam níveis de eficácia e de modernidade tecnológica comparáveis aos melhores serviços postais do mundo. Criou-se uma elite de técnicos e administradores altamente preparados, atualizados e motivados. Tive o prazer de ser professor de muitos deles em cursos de especialização e invariavelmente o pessoal dos Correios estava entre os mais brilhantes e mais focados na qualidade.

De repente as coisas começam a desandar e, não surpreendentemente, exatamente quando os "tecnocratas" passaram a ser substituídos por administradores "com sensibilidade política", indicados pelos partidos políticos que sustentam os governantes no poder. Quem não se lembra que o maior escândalo político de todos os tempos no Brasil, que foi a crise do mensalão, começou quando um advogado paranaense, fingindo-se de empresário, filmou a cena em que entregava um maço de dinheiro a um dirigente dos Correios , que o embolsou gostosamente. Na sequência, o distinto público ficou sabendo que o episódio estava longe de ser isolado e que o PTB de Roberto Jefferson, havia recebido os Correios como capitania hereditária política e agia com absoluta desenvoltura, dirigindo licitações, exigindo contribuições "políticas" e coisas do gênero. Roberto Jefferson, malandro de parque de cavalinhos, não deixou por menos e denunciou que o que o PTB fazia era uma parte minúscula de um enorme tumor de corrupção que se espalhava em metástase incontrolável. O resto é bem conhecido, inclusive a falta de memória e de brio cívico dos eleitores paulistas que levaram de volta ao Congresso, João Paulo Cunha, José Genoíno e outros expoentes mensaleiros.

Mas não é esse o ponto a que quero chegar e sim lamentar que os quarenta anos em que os Correios se transformaram em um padrão mundial tenham sido jogados no lixo sem cerimônia por uma política desastrosa de indicações políticas e arranjos de compadrio. Quando a competência técnica é substituída pela conveniência política, quando os dirigentes dos órgãos públicos e quase-públicos substituem a lealdade ao Estado e aos cidadãos pela vassalagem ao seus padrinhos, não há porque se surpreender – copiando Chico Buarque – a pátria mãe, tão distraída e sem saber, esteja sendo subtraída em tenebrosas transações.

O pior é que o processo de aparelhamento político das empresas e dos órgãos estatais não se limitou aos Correios e, portanto, não será de estranhar que outros prepostos de partidos e outras "Erenices" estejam patrocinando negócios semelhantes em áreas até agora insuspeitadas. Quem viver, verá.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do Doutorado em Administração da PUCPR

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