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Celso Furtado (Imagem: Acervo do Arquivo Nacional/Reprodução)
Celso Furtado (Imagem: Acervo do Arquivo Nacional/Reprodução)| Foto:

Dos grandes autores lembramos o que escreveram, dos maiores adotamos o pensamento, mesmo sem saber o nome. Nós pensamos com base nas ideias de Spinoza, Erasmo, Adam Smith, Descartes, Aristóteles, Keynes, Arendt e outros que romperam posições do passado e inventaram novas formas de entender a realidade.

Alguns brasileiros explicaram “de onde vem”, “como é”, “para onde deve ir” o Brasil; como Joaquim Nabuco, Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Holanda, Celso Furtado, Darcy Ribeiro, Anísio Teixeira. Desses, Celso Furtado tem influência decisiva para explicar “de onde viemos”, “por que somos subdesenvolvidos”, quais são os “entraves ao nosso desenvolvimento”, “como nos desenvolvermos”.

Antes do livro Formação Econômica do Brasil, víamos a nossa história como uma sucessão de fatos, especialmente políticos. Graças a Celso Furtado, passamos a entender a lógica e as forças que nos empurraram. Seus livros Desenvolvimento e Subdesenvolvimento, Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico e Dialética do Desenvolvimento são básicos para entender como certas economias se desenvolvem e por quais motivos outras ficam estagnadas.

Mas ele não foi apenas analista, foi também formulador de caminhos. Devemos a ele documentos básicos de estratégias para o desenvolvimento, como o Plano Trienal, e para superar a tragédia da pobreza e da desigualdade regional. Foi formulador da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e homem de ação. A engenharia política para aprovar no Congresso leis que serviram de base à criação da Sudene e dos instrumentos de incentivos fiscais foi uma obra de genialidade conceitual e articulação política; como Nabuco em maio de 1888 para aprovar a Lei Áurea. No seu livro O Mito do Desenvolvimento, trouxe a percepção dos limites do desenvolvimento, tanto quanto Nabuco lembrou que a abolição não se completaria sem reforma agrária e educação.

Por tudo isso, 100 anos depois de seu nascimento, o pensamento e o exemplo de Celso Furtado estão vivos em milhões de brasileiros que, sem saber, usam conceitos e palavras que ele criou, sonham para o Nordeste e para o Brasil rumos que ele definiu e temem resultados negativos para os quais ele alertou.

A maior homenagem a ele não é, entretanto, lembrar a importância de sua obra, mas ter consciência de como ele nos faz falta agora, neste momento de transe, sem coesão e rumo. A maior lição de Celso foi o exemplo de pensar com rigor analítico e liberdade imaginativa, sem amarras, líderes e ou siglas partidárias. Olhando para sua própria obra e para os desafios de hoje, a maior homenagem ao Celso é agradecer pelos pilares intelectuais que ele nos deu, e pensar novas ideias e novos instrumentos para enfrentar os novos desafios. Agir como ele agiria: pensando além do que ele nos ensinou.

Cristovam Buarque é professor emérito da Universidade de Brasília.

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