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A nova economia dos biocombustíveis está se revelando uma chave poderosa para que o Brasil ingresse no primeiro time mundial de países. Agora mesmo, paralelamente ao encontro do G8, que congrega os sete países mais ricos do planeta e a Rússia – esta por razões estratégicas – o Brasil e outros quatro países vão se reunir para definir uma agenda de expansão das fontes alternativas de energia a ser desenvolvidas para reduzir a dependência do petróleo nos próximos dez anos. Ou seja, finalmente temos uma moeda de troca poderosa nesse jogo de brutamontes: terra, sol, tecnologia, gente, posição geográfica. E pela primeira vez não necessitaremos recorrer ao habitual estoque de lamúrias contra a opressão dos ianques e dos países desenvolvidos.

A definição política dos Estados Unidos de reduzir seu consumo de óleo em 20% nos próximos dez anos é algo cuja repercussão ainda não foi devidamente avaliada. Primeiro porque lá essas coisas costumam ser levadas a sério e transformadas em legislação rapidamente. Segundo porque as duas vias que os americanos pretendem tomar são a redução do consumo mediante o aumento da eficiência energética de veículos e pela expansão da produção de biocombustíveis. No primeiro caso, os ganhos serão penosos pois já há vários anos os preços altos dos combustíveis têm levado a indústria automotiva a melhorar seu desempenho. Basta comparar o que gastava um veículo em média nos anos 90 e agora: quase a metade para a mesma quilometragem. Nem ouso comparar o que gastava meu querido Buick Par Avenue 1974, que hoje seria simplesmente proibido de transitar.

No segundo, a reconversão da agricultura americana para a agroenergia também tem enor-mes implicações pois a economia agrícola americana é baseada no milho que alimenta a indústria de rações, do frango, dos alimentos de consumo humano, etc. Qualquer mudança dessa direção tem efeitos imediatos sobre os preços e a oferta. E aí é que entra o Brasil.

Mas é preciso, desde já, exorcizar os demônios do atraso e da ignorância travestida em cautela que sempre nos assaltam nesses momentos pivotais. As preocupações com a falta de alimentos no país e no mundo em função da expansão dos biocombustíveis são simplesmente ridículas por várias razões, algumas das quais vou comentar. Em primeiro, sem precisar ampliar um hectare de área plantada, a produção agrícola brasileira pode aumentar 50%, 60%. Isto porque nossos níveis de produtividade média são muito baixos em comparação com os dos líderes mundiais. Produzimos, em média, menos da metade do milho que americanos e neozelandeses produzem em áreas de igual tamanho; o mesmo no arroz, no feijão, no amendoim, no algodão e por aí afora, em que estamos muitíssimo longe dos melhores índices mundiais. No mundo inteiro então, as discrepâncias entre a produção efetiva e a produção possível são ainda maiores.

E a possibilidade de expansão? Todas as vezes que se fala disso, lá vem o exemplo da floresta amazônica, que teria de ser devastada para acomodar o aumento da área agrícola. Outro equívoco: o Brasil tem milhões de hectares de cerrado e de outras terras não-pertencentes à floresta amazônica inexoploradas ou sub-exploradas. Um aumento de ocupação econômica dessas áreas pode ser obtido simplesmente mediante uma boa dosagem de políticas públicas que privilegiem a expansão e penalizem a manutenção de áreas sub-utilizadas.

De resto, é só entender a motivação dos críticos. Hugo Chávez, um deles, apenas faz eco ao que já vem sendo declarado pe-los seus colegas do cartel petrolífero da Opep, que ameaçam levar o preço do petróleo às nuvens caso os consumidores de óleo resolvam mesmo tentar reduzir seu consumo. Isso, além de uma tentativa pouco sutil de chantagem, é outra tolice pois não há cartel que resista a um aumento da oferta sem que seus membros sofram a tentação de quebrar por conta própria seu monolitismo. O mesmo vai acontecer com outro ídolo do movimento retro-desenvolvimentista brasileiro, Evo Morales, que logo logo descobrirá que seus maiores clientes de gás têm fontes abundantes ou alternativas que demoram alguns anos para ser mobilizadas mas logo estarão disponíveis.

Restam as críticas de Fidel Castro, mas que dizer do velho comandante? Ele passou 50 anos defendendo e praticando o retrocesso e chamando a isso de estratégia de desenvolvimento autônomo. No limiar da era do conhecimento, Cuba tem poucos troféus a mostrar: uma economia mendicante, que nada tem de autônoma; uma população escolarizada, mas que não tem empregos ou possibilidades de avanço pessoal em suas vidas; um nível de saúde que impressiona aos brasileiros porque aqui estamos no nível de saúde pública que freqüentemente se parece com o do interior da África, mas que já foi atingido há muito tempo em todo o mundo civilizado, sem que tenha sido necessário sufocar durante meio século as liberdades civis de toda uma população.

O velho comandante não toma jeito. Pior ainda são seus discípulos locais que enxergam nele um dom Sebastião sem a batalha de Alcacer-el-Kibir, pronto para salvá-los. De quê? Boa pergunta. A julgar pela idade dos carros que rodam em Cuba queimando gasolina, acredito que seja da modernidade.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor universitário.

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