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O conhecimento e a aplicação de uma legislação básica que rege a ação governamental era suficiente para bons gestores públicos desempenharem seus papéis institucionais de forma eficente. Na área orçamentária, era imprescindível o entendimento e a familiarizacão com a Lei 4.320/1964; na área administrativa e de gestão de pessoas, bastava a leitura atenta do Estatuto do Servidor e de uma lei que ordenasse as licitações – no caso, a Lei 8.666 –, mais, evidentemente, a observação plena dos dispositivos constitucionais, da União e dos estados. O gestor municipal deveria, ainda, seguir a Lei Orgânica do Município, o Plano Diretor e o Estatuto da Cidade.

As gestões mais recentes tiveram de se adaptar, ou deveriam se adaptar, aos dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, um conjunto de dispositivos legais óbvios e imprescindíveis às boas práticas de administração. Esta lei tentou resgatar o processo de planejamento governamental, aperfeiçoar a elaboração dos orçamentos públicos, estabelecer parâmetros para a fixação de despesas públicas e limitações para o aumento do endividamento público. A transparência na gestão fiscal seria o principal instrumento para o controle social.Paradoxalmente, todo esse arcabouço legal também levou à rigidez institucional e é refratário a mudanças de rotinas, criatividade e inovações na gestão.

Após um período de drásticos ajustes nas contas públicas – com o sacrifício efetivo de alguns segmentos da sociedade, notadamente da chamada "classe média" e da maioria dos servidores públicos –, derivados da implantação do Plano Real, a estabilidade foi alcançada, mas já aparenta estar seriamente ameaçada. Uma consequência imediata é a realidade inflacionária, que, como resultado, trará um novo ciclo de sofrimento profundo dos segmentos sociais mais humildes, com a queda significativa da qualidade de vida arduamente alcançada.

A necessidade de um amplo corte no orçamento para manter as contas públicas sob controle é uma unanimidade. Esse corte deve atingir todos os entes federativos – União, estados e municípios. Por outro lado, o sentimento generalizado é de que isso não vai ocorrer, até pelo próprio engessamento da gestão pública, pela legislação que citamos. E é sobre a Lei 4.320 que sugerimos que um dos focos de mudanças deve ser prioritário e objeto urgente de iniciativas do Congresso Nacional.

A Lei 4.320 foi um dos últimos atos assinados pelo presidente João Goulart, inspirada em legislação norte-americana conduzida pelo secretário de Estado Robert McNamara, que visava dotar a gestão pública de um instrumento eficaz de implementação de políticas públicas e que foi motivo de um esforço enorme da administração pública brasileira para sua adoção. Hoje, podemos afirmar que ela dotou o poder público de um orçamento- programa, capaz de sinalizar para a sociedade quais os objetivos das ações governamentais e capaz de nortear a iniciativa privada para os rumos previstos para o desenvolvimento do país e induzir seus investimentos.

O cenário existente hoje no Brasil guarda alguma semelhança com o cenário norte-americano de 1985, notadamente no que diz respeito aos desequilíbrios das contas públicas. Naquela ocasião, os senadores americanos Phil Gramm (republicano do Texas), Warren Rudman (republicano de New Hampshire) e Ernest Hollings (democrata da Carolina do Sul) lançaram o que ficou conhecido como Gramm-Rudman-Hollings Balanced Budget and Emergency Deficit Control– ato de 1985 no qual dividiram o orçamento em despesas possíveis de serem cortadas e despesas inalteráveis.

Com isso, toda vez que precisavam alterar o orçamento, aumentavam a receita quando possível e/ou reduziam as despesas flexíveis com muita efetividade. Esse ato foi complementado em 1987, com o Budget and Emergency Déficit Control Reaffirmation Act ; o então presidente Ronald Reagan, republicano, apoiou e assinou as mudanças, que trouxeram os ajustes devidos ao orçamento público no curto prazo. Na década seguinte, o democrata Bill Clinton conseguiu implementar dois mandatos com desenvolvimento acentuado e prosperidade.

E é essa a sugestão: dotar o Poder Executivo brasileiro de atos semelhantes, para poder fazer frente às alterações orçamentárias que devem ser feitas, sem a necessidade de "árduas" negociações políticas.

Herbert Antonio Age José é professor do Departamento de Administração, do Setor de Ciências Sociais Aplicadas da UFPR.

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