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Como um país com tantos problemas na parte de infraestrutura de transporte que elevam muito o "custo Brasil" pode cogitar gastar dezenas de bilhões de reais na construção de um trem bala?

O elevado crescimento da economia chinesa por vários anos consecultivos vem mudando o cenário do comércio internacional, com impactos relevantes na dinâmica da economia brasileira. De acordo com dados do FMI, a parcela das exportações brasileiras com destino à China passou de 2% para 12,5%, entre 2000 e 2009.

Essa demanda impulsionou as exportações brasileiras de produtos básicos como soja, milho, carnes e minérios. Uma prova disso é que o valor das exportações de produtos básicos ultrapassou o de manufaturados, em fevereiro do corrente ano. A elevação da participação de produtos básicos não é um problema desde que a competitividade dos demais bens não seja comprometida via apreciação cambial. Na verdade, dependendo das políticas econômicas adotadas pelo governo federal, pode ser uma excelente oportunidade para que o país cresça sem criar problemas nas contas externas.

Considerando que a China possui cerca de 20% da população mundial, que a sua renda média ainda é baixa, que seu crescimento provavelmente continuará elevado nos próximos 10 anos e que não possui terras suficientes para garantir autossuficiência alimentar, a demanda por produtos básicos continuará relevante. O Brasil poderá aproveitar ou não essa oportunidade dependendo do montante e modo de realização dos investimentos em infraestrutura de transportes.

Já presenciamos grandes problemas no escoamento de produtos agrícolas produzidos, principalmente, no Centro Oeste do país. Devido à presença de grandes rios navegáveis, das menores distâncias produção/porto e da maior proximidade com o mercado de destino, a forma mais eficiente e natural de escoamento seria pela região Norte do país (Arco Norte). Os portos dessa região estão a quatro dias de viagem (oito considerando ida e volta) mais perto dos principais mercados (Atlântico Norte, Mediterrâneo e Oriente Médio) em relação aos do Sul e também do Canal do Panamá, que passa por grande ampliação capaz de revolucionar a logística nos oceanos Atântico e Pacífico, além de reduzir o tempo de viagem para o mercado asiático.

No entanto, não é isso que ocorre devido à falta de infraestrutura adequada, principalmente em relação à capacidade dos portos dessa região. Por essa razão, quase a totalidade da produção passa por rotas muito mais longas e antieconômicas rumo aos portos do Sul e Sudeste, que também não estão preparados para elevações significativas no fluxo de mercadoriass, vide problemas recorrentes que já ocorrem nos mesmos.

Existem ainda outros problemas em se utilizar esses portos. Por exemplo, maior desgate em rodovias financiadas com recursos públicos, emissão de gases poluentes e acidentes de trânsito, sendo que estes geram custos sociais e econômicos adicionais como problemas familiares (desgaste emocial, perda do chefe de família, etc.), gastos no sistema de saúde, entre outros.

Os altos custos logísticos enfrentados pelo nosso agronegócio têm contribuído para um paradoxo. Por um lado, temos condições naturais favoráveis, produtores capazes e padrão tecnológico de vanguarda. Por outro, endividamento endêmico, "abortamento" da produção’, falta de competitividade "da porteira para fora" e pobreza no campo. Esse cenário faz com que o país perca competitividade, mercados potenciais, empregos e renda.

Como um país com tantos problemas na parte de infraestrutura de transporte que elevam muito o "custo Brasil" pode cogitar gastar dezenas de bilhões de reais na construção de um trem bala? Se o país almeja alcançar a rota do crescimento sustentável, é preciso que se tenha um planejamento estratégico para investimentos em infraestrutura e para atrair e/ou não impedir a participação do capital privado, especialmente pelas restrições no orçamento público.

Luiz Antônio Fayet, economista, é consultor em logística.E-mail: fayet@uol.com.br

Luciano Nakabashi, doutor em economia, é professor do Departamento de Economia da UFPR e pesquisador do CNPQ. E-mail: luciano.nakabashi@gmail.com

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