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Estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo constatou que 72,0% de um conjunto de 31 segmentos industriais vêm sendo abalados pela sobrevalorização cambial, experimentando quedas dos preços de exportação em reais (mesclando as trajetórias da taxa de câmbio e das cotações externas) no segundo trimestre de 2006, tendo como base comparativa a média verificada entre 2000 e o primeiro semestre de 2006.

As quedas mais expressivas foram em madeira e mobiliário (-2,1%), calçados (-6,3%), máquinas e tratores (-6,9%), químicos e farmacêuticos e perfumaria (10,1%), automóveis, caminhões e ônibus (-10,2%), minerais não metálicos (-13,5%), têxtil e vestuário (14,0%), papel e gráfica (-17,0%), óleos vegetais (18,0%), outros veículos e peças (-18,3%) e equipamentos eletrônicos (-39,3%). O elenco de atividades fragilizadas representaria cerca de dois terços do valor das exportações brasileiras.

Escaparam da conjuntura negativa os ramos de açúcar, metalurgia, café, extrativa mineral, extração e refino de petróleo e gás e químicos, cujos preços em reais subiram 33,7%, 26,3%, 25,7%, 23,7% e 18,0% e 9,0%, respectivamente, no mesmo período. Em conjunto, essas atividades responderiam por aproximadamente um terço das exportações e menos de 8,0% do emprego industrial do país. Conforme o Banco Mundial, entre 2002 e 2006, as cotações das commodities (em dólares e sem petróleo) observaram incremento de 60,0%, sendo que as das metálicas e do petróleo variaram 180,0% e 280,0%, respectivamente.

Mais que isso, segundo dados da Consultoria Economática, se retiradas a Petrobrás e a Vale do Rio Doce, empresas que fabricam produtos valorizados na fronteira internacional como derivados de petróleo e minério de ferro, os investimentos líquidos em ampliação da capacidade produtiva (exceto o montante destinado à manutenção e reposição de peças e equipamentos) de 231 companhias abertas recuaram de R$ 83,4 bilhões entre 2000 e 2002 para R$ 42,7 bilhões no período 2003–2005.

Esse posicionamento empresarial, contrário à inversão em ativos ligados ao crescimento, também exprime a inclusão, no processo de escolhas estratégicas, de parâmetros que escapam da lógica econômica direta, como a multiplicação e comprovação de denúncias de corrupção, a precarização das condições de segurança pública e a ampliação dos riscos jurídicos.

Em sentido análogo, apurações do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), mostram que a rentabilidade (lucro/patrimônio líquido), de uma amostra de 101 companhias industriais caiu para 10,0% no primeiro semestre de 2006, contra 13,9%, 11,6% e 11,9%, respectivamente, no mesmo período de 2005, 2004 e 2003 puxadas pelos ramos de alimentos, siderurgia, material aeronáutico, papel e celulose e química.

A compressão da rentabilidade constitui fator decisivo ao encolhimento dos projetos em ampliação do estoque de capital fixo, especialmente se forem levados em conta a fragilização dos mecanismos de financiamento dos investimentos de longo prazo, a natureza embrionária do mercado de capitais brasileiro e, conseqüentemente, o forte peso dos recursos próprios para a geração de excedentes das empresas. Some-se a isso a progressividade da estrutura tributária (prejudicial à produção, ao investimento e ao emprego) e a insuficiência de programas de investimento em inovação educação fundamental (em benefício do ensino superior).

Nesse contexto, mesmo tendo em conta a deterioração fiscal do Estado brasileiro e a necessidade de o setor privado participar mais ativamente da execução de blocos de inversões pesadas, cumpriria sublinhar que as reduzidas taxas de retorno e o longo período de maturação dos projetos em infra-estrutura e em bens intermediários recomendariam ações públicas diretas ou indiretas (via Parceira Público Privadas) de apreciável envergadura.

Curiosamente, o desate desse nó não afigura-se tão complicado. Na verdade, a sintonia fina entre empreendimentos públicos e privados poderia derivar da troca da visão conjuntural da gestão econômica, formada pela perseguição da combinação entre metas de inflação (Banco Central), superávit fiscal primário (Fazenda) e recordes de arrecadação (Receita Federal), por ingredientes estruturais de natureza macro e micro.

Do ângulo macro, aflora a premência na diminuição dos encargos da dívida mobiliária do Tesouro (via redução de juros e/ou conversão de passivos do Estado em investimentos, por meio do redirecionamento de recursos para o circuito da produção sem calotes), no controle dos fluxos de capitais especulativos (proposta de Yoshiaki Nakano, assessor do candidato derrotado no segundo turno das eleições presidenciais), na concretização do ajuste fiscal pelo encolhimento das despesas correntes nas diferentes esferas da administração pública, e no aprimoramento do sistema educacional.

Do vértice micro, surge o recuo dos juros e dos tributos, para reduzir o grau de apropriação do patrimônio público pela classe dos rentistas, e do rompimento dos pontos de estrangulamento infra-estruturais como elementos indispensáveis à recuperação da rentabilidade dos projetos. A concentração do crédito em poder dos dez maiores bancos atuantes no país saltou de 73,9% para 84,8% do montante total de recursos entre junho de 2002 e junho de 2006.

Gilmar Mendes Lourenço é economista, coordenador do curso de Ciências Econômicas da UniFAE – Centro Universitário – FAE Business School.

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