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Este é um ano crucial para a diplomacia inter­nacional e para o Conselho de Segu­rança da ONU encontrar uma saída para a tensão nuclear que domina o cenário político mundial

Se fizer sentido citar uma única descoberta científica do século passado que tenha produzido um impacto tão profundo na ciência e na tecnologia, na moral humana, na política mundial e no destino da humanidade, é bem provável que ela corresponda à fissão do átomo de urânio.

O experimento que levou à descoberta da quebra do núcleo atômico foi realizado no final de 1938 numa Alemanha já sob o domínio da ideologia nazista. Motivados pelo temor que Hitler se dedicasse à criação de um artefato bélico utilizando a nova fonte de energia, cientistas norte-americanos e europeus participaram nos Estados Unidos do mais secreto projeto científico e tecnológico da história moderna: o Projeto Manhattan, cujo objetivo era a produção de explosivos nucleares. Como resultado da empreitada norte americana, foram construídas três bombas atômicas: uma para teste (o teste Trinity) e duas outras, denominadas Litle Boy e Fat Man, que foram lançadas nos dias 6 e 9 de Agosto de 1945 sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, respectivamente. Mais de 100 mil pessoas morreram nas duas cidades nos primeiros segundos. Desde então, mais sete países tornaram-se nuclearmente armados: Rússia, Inglaterra, França, China, Israel, Índia e Paquistão, somando mais de 20 mil ogivas, a maior parte delas dezenas de vezes mais poderosas do que as bombas que explodiram no Japão e um número incerto, cem vezes mais potente.

Atualmente, a instabilidade no panorama nuclear mundial tem sua origem numa tríade de países regidos por sistemas políticos pouco confiáveis, como o Irã, a Coreia do Norte e o Paquistão. O estágio avançado em que o programa nuclear iraniano se encontra, o hermetismo diplomático da Coreia do Norte e o esfriamento das relações entre os Estados Unidos e o Paquistão, tornam o ano de 2012 crucial para a diplomacia internacional e para o Conselho de Segurança da ONU encontrar uma saída para a tensão nuclear que domina o cenário político mundial. O governo de Ahmadinejad resiste em ceder às pressões internacionais e dificulta, quando não impede, as inspeções da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) às suas instalações nucleares, cujo objetivo principal é a interrupção do enriquecimento do isótopo de urânio 235 a níveis que poderão chegar a 90%, grau de pureza suficiente para a produção de uma arma nuclear. Numa recente publicação da revista científica britânica Nature, há referência a um relatório elaborado pela AIEA sobre o suposto desenvolvimento de uma arma nuclear pelo governo iraniano, com design semelhante à da bomba atômica lançada sobre Nagasaki e utilizando urânio, mesmo combustível da bomba atômica de Hiroshima. Este artefato poderia fazer parte do míssil de médio alcance Shahab-3, capaz de atingir um alvo a 3 mil quilômetros de distância, o dobro da distância entre Teerã e Jerusalém.

É fato que a Coreia do Norte possui tecnologia para e armas nucleares; a incerteza é em relação ao nível de sofisticação deste programa. Em 2006, segundo fontes do próprio governo coreano, um artefato nuclear foi detonado. Estima-se que o poder explosivo tenha sido inferior a 1 quiloton, menos de um décimo do poder da bomba de Hiroshima. A "baixa eficiência" do artefato, atribuída a alguma falha de projeto, foi superada por um novo teste realizado em 2009, que segundo dados da Organização do Tratado de Proibição Total de Testes Nucleares (CTBTO) provocou um tremor de magnitude 4,52 a uma profundidade de 10 quilômetros.

O desgaste da relação entre Washington e Islamabad, que teve início pelo lado americano na desconfiança de que o governo paquistanês sabia do paradeiro de Bin Laden e pelo lado paquistanês pela invasão de seu território na caça ao terrorista, pode colocar em risco o arsenal nuclear do país, seja pela redução da ajuda financeira dos Estados Unidos no combate ao terrorismo ou pela ascensão ao governo de grupos radicais ou politicamente não alinhados com Washington. Qualquer uma das possibilidades deixaria a região em estado de alerta máximo, em parte devido à disputa entre os Estados nucleares Paquistão e Índia pela região da Caxemira.

Após 66 anos do genocídio praticado contra as populações das cidades de Hiroshima e Nagasaki, o fio de esperança que sustenta a humanidade contra sua autoextinção depende de inesgotáveis, embora já desgastadas, negociações diplomáticas.

Dinis Gomes Traghetta, professor de Física da Engenharia Civil da Universidade Positivo, é mestre e doutor em Física pela USP-São Carlos.

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