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Intenções podem ser louváveis, mas pessoas não são números
| Foto: Felipe Lima

Sim, o ministro Guedes tem razão: a educação infantil é a fase educacional mais importante de todas, e o Brasil investe, proporcionalmente, muito mais no ensino superior. Investimentos em outras fases que não a educação infantil apresentam o que os economistas chamam de trade-off entre equidade e eficiência. Um trade-off é uma escolha que está relacionada a um dilema, ou seja, qualquer das soluções escolhidas apresenta um alto custo a ser levado em conta.

No caso dos investimentos em educação, podemos utilizar os recursos para investir em pessoas com maior desempenho, por exemplo, e ter um retorno maior (eficiência); ou investir em pessoas com baixa condição socioeconômica e proporcioná-las a oportunidade (equidade) de terem uma vida melhor do que teriam sem a política. A primeira opção com certeza fará com que os resultados sejam os maiores possíveis, já que esses alunos tiveram uma boa base – e muito provavelmente vêm de uma classe mais favorecida. Já a segunda opção pode não ser o investimento mais eficiente (do ponto de vista econômico), mas dará oportunidades para pessoas que nunca teriam uma chance, além de envolver uma redução de outros custos futuros como transferências governamentais e gastos com criminalidade, dentre outros.

Portanto, um dos melhores argumentos para o investimento nas crianças durante a primeira infância é que para essa fase educacional não existe um trade-off entre equidade e eficiência. Dado que estão no início do desenvolvimento escolar, não existe como investir de maneira mais eficiente em um grupo ou em outro. Do ponto de vista da política e dos seus resultados, todas as crianças são iguais. A criação de vouchers para crianças de baixa renda, na prática, vai selecionar crianças pobres para escolas particulares ruins, como acontece com a política do ProUni e a superexpansão das faculdades privadas de baixa qualidade.

Famílias de classe baixa, passíveis de serem beneficiadas com os vouchers, terão como critério de decisão a proximidade da escola com seus endereços de domicílio, ficando condicionadas a creches de baixa qualidade. É uma falácia dizer que todas as escolas privadas têm qualidade superior às públicas. E o valor do voucher para atender a toda essa demanda não seria suficiente para alcançar as melhores instituições, mesmo que fosse esse o critério de decisão dos pais. Ainda que o valor fosse suficiente, essas instituições poderiam subir seus preços a fim de “selecionar” o público que gostariam de atender.

Além dessa questão, existe outra, de oferta. Não existe hoje, no Brasil, a quantidade de creches privadas que atenda a essa demanda. Dados de 2016 da Pnad Contínua mostram que 73,5% das crianças frequentavam escolas públicas no ensino básico. Uma expansão, mais uma vez, teria um efeito enorme sobre a qualidade. Seriam criadas escolas sob condições mínimas apenas como efeito da expansão dos recursos governamentais e, num primeiro momento, avaliar e acompanhar essas escolas teria um custo ainda maior.

Investir no acesso esquecendo-se da qualidade é um erro. Que o critério técnico seja mais importante que a popularidade dessa ideia para aqueles que defendem o mercado como principal mecanismo de seleção. Pessoas não são números.

Walcir Soares Junior (Dabliu), doutor em Desenvolvimento Econômico, é professor de Economia na Universidade Positivo.

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