• Carregando...
 | Pedro Serápio/Gazeta do Povo
| Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo

A partir da chama acessa pelo ex-ministro-presidente do STF Joaquim Barbosa, infeliz e precocemente aposentado, o Brasil experimenta uma mudança revolucionária nos julgamentos e sentenças na mais alta corte de Justiça. Educação, saúde e segurança públicas são exigências pétreas de nossa Constituição. Mas, mais do que este trio, do que mais necessita uma população tão heterogênea é a aplicação firme da justiça, sobremaneira para quem rouba e deixa roubar. O que pede a mudança – justiça para todos os credos, raças, posições sociais, no público e privado – é invalidar o conceito arraigado e escrachado por um valente e consciente magistrado catarinense ante seus pares com o mote “No Brasil, só existe a justiça para os três ‘p’: pobre, preto e prostituta”. Por estas e por outras verdades, está este probo cidadão sendo caçado e (talvez até) cassado por alguns de seus pares.

Mas retornemos à fatia nobre do Judiciário: um juiz federal Sergio Moro, um Dallagnol no Ministério Público Federal e vários delegados da Polícia Federal. O trabalho conjunto e paciente, mas eficiente, dos mesmos já trouxe à prisão dezenas dos meliantes que destroçaram a Petrobras e outras empresas públicas e saquearam, impunemente, por mais de uma década, o erário público: deputados, senadores, diretores da estatal do petróleo, presidentes das maiores empreiteiras, lobistas, marqueteiros de campanhas milionárias, lobistas e secretários de vários partidos políticos.

O trabalho conjunto e paciente, mas eficiente, já trouxe à prisão dezenas dos meliantes que destroçaram a Petrobras

Para quem anseia pelo desfecho final – ou seja, a punição exemplar do mentor maior desta barbárie financeira –, surgiram justificados interrogantes: o MP, com o auxílio da PF, prospecta, investiga, confisca e elabora a denúncia por causa de indícios, denúncias, fatos e provas. O juiz – Moro, sempre ele – intima, coercitivamente ou não, o denunciado e preso temporário a responder um inquérito preliminar e lhe abre o recurso de defesa. Convencido da culpa, exara sentenças rígidas de até 30 anos de presídio. Surge, então, o mecanismo da delação premiada, cujos elementos tendem a facilitar o entendimento da gravidade total de cada crime. Pergunta-se: cabe tão somente ao STF ou a algum de seus ministros o aceite para uma delação premiada? Quem tem o poder de lei para amenizar uma sentença prisional de 25 a 30 anos para apenas três, e em confortável regime domiciliar em mansões certamente adquiridas com o opróbrio de sucessivos roubos descarados e o consolo de uma tornozeleira eletrônica? Este mesmo foro judicial? Em assim sendo, em que o somatório das delações premiadas dos maiores bandidos – caso, por exemplo, dos altos diretores da Petrobras – se presta à feitura de justiça e imposição de penas exemplares para todos, a fim de que estes fatos nunca mais repitam?

Respostas afirmativas a estas indagações levarão ao conceito de que esta “Lava Jato” faz jus ao título: uma limpeza de aparências, deixando incólume a sujeira maior interna do grande motor que gerou este lamentável retrocesso em todo o país. Pari passu a delação premiada vale mais como “prêmio” do que como “delação”. Um competente causídico de uma conceituada banca da “República de Curitiba” arroja seu entendimento. Estas questões são regidas pela Lei 12.850/2013 em seus artigos 4.º e seguintes: para um réu comum, decisões todas centradas no juiz de primeira instância; para réus com foro privilegiado, casos de deputados federais e senadores, o STF é a instância decisória para valer.

Enfim, a pergunta final. Quando efetivamente iniciar-se-á a real punição complementar que se impõe: o confisco dos bens, no país e em contas no exterior, de cada marginal de colarinho branco e gravata importada? Esta bandidagem polivalente tem apenas um ponto sensível à dor: o próprio bolso e os de seus herdeiros milionários da noite para o dia (ou vice-versa), como é exatamente o caso do corrupto maior da quadrilha, inicialmente presa do deslumbramento pelo poder, suas benesses e, a seguir, do dinheiro ilícito e abundante repartido com seus comparsas públicos e privados. Esta é a justiça que interessa ao lesado povo brasileiro. O crime assusta; a impunidade revolta.

José Domingos Fontana é professor visitante sênior na UTFPR-Ecoville.
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]