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No rame-rame provocado pela paralisia do governo à espera da posse do mesmo presidente, aproveito a folga para contar a lição municipal de criatividade e competência, aprendida no último fim de semana, em Natal, a capital do Rio Grande do Norte, em vigoroso surto de crescimento. Convidado a participar do segundo Encontro Natalense de Escritores, voltei a Natal uma vez mais na longa história de mais de meio século de visitas espaçadas.

E desde o terceiro debate que assisti na rodada inaugural de quinta-feira, dia 23 deste mês – com o bate-papo de altíssimo nível entre Affonso Romano de Sant´Anna, a dar voltas no espaço nas redefinições de cultura e no seu tema intrigante, Centro e Periferia e Jorge Mautner – dividi a atenção entre o que desfilou no palco e os rodeios da cuca sobre o segredo do sucesso de uma iniciativa que não é a única, mas que se distingue pelas suas singularidades.

Uma pausa: o escritor e jornalista Ruy Castro e sua mulher, Heloísa Seixas, com as mesmas credenciais, prendem a atenção da platéia com 400 cadeiras e espaços para quem agüenta permanecer de pé ou sentar no chão, conta histórias de suas pesquisas que sustentam o sucesso de livros campeões de vendagem, como "A Porta" da esposa ou "A Estrela Solitária", biografia de Garrincha, O "Anjo Pornográfico" (Nélson Rodrigues) e "Carmem", a vida de Carmem Miranda.

A noite fecha com o show de Paulinho da Viola. A simplicidade, a simpatia, a paciência com que atende ao público que o cerca, as qualidades natas de um contador de casos de compositores, músicos e cantores ligadas às raízes da música popular explicam a casa lotada e os aplausos e pedidos de bis.

Dois imortais da Academia Brasileira de Letras, Evanildo Bechara e o natalense Murilo Melo Filho, em hora e meia de exposições eruditas, cuidaram das suas especialidades. Bechara ensinou gramática em livros didáticos a milhões de brasileiros. E Murilo resumiu a história da ABL, seus segredos, costumes, exigências e peculiaridades.

Na minha vez, premiado com a parceria de Zuenir Ventura, amigo de décadas, jornalista e escritor de obras consagradas por tiragens recordistas e um expositor fluente. Aprendi como ouvinte atento e apenas dei o meu recado.

Nelson Mota e Antônio Cícero, em dupla de perfeita afinação, passearam pela música popular brasileira. Um mestre do improviso, senhor da arte do absoluto domínio da palavra, o jornalista e escritor Ignácio Loyola Brandão, autor de 26 livros, durante uma hora e meia, sozinho no palco, foi o dono da noite.

E que fecharia, com a apresentação do "Grupo Araruna – Sociedade e de Danças Antigas e Semi-Desaparecidas" fundado, em 1956, pelo mestre Cornélio Campina, rijo nos seus 98 anos; Câmara Cascudo e Veríssimo de Melo e com o show da cantora potiguar Roberta Sá em ascensão nacional e com imenso prestígio na sua terra.

E volto ao tema: qual é o segredo de uma iniciativa de êxito instantâneo e com todas as possibilidades de pegar e abrir o caminho para firmar-se como tradição popular? Em Natal, o prefeito Carlos Eduardo Alves ousou o desafio de uma iniciativa ousada. E foi em frente. No projeto de recuperação da Ribeira encaixou, no espaço espremido na área de preservação histórica, um pavilhão para acolher o ENE. Com a prata da casa, montou a base. Nos dois anos do seu mandato pretende inaugurar o pavilhão definitivo, em projeto revolucionário. E realizar, no próximo ano e em 2008, os encontros natalenses que finquem a estacas que resistam ao tempo.

Da bateia nas águas do Rio Potengi, um diamante raro: todos os debates do ENE foram conduzidos pela apresentadora Margot Ferreira. Jovem, bela e elegante senhora e a grande revelação como das mais completas do país. Sem nenhuma pretensão de aparecer, perfeito controle dos debates e ampla base cultural que facilitou a formulação de perguntas sobre os mais variados temas.

A fórmula do sucesso não tem segredo. Tal como a do fracasso. Qualquer prefeitura pode inspirar-se no exemplo e abrir um espaço para a cultura erudita e popular.

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