Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
artigo

Livre iniciativa e liberdade religiosa

Ainda causa certa polêmica e perplexidade o caso recente da floricultura Arlene’s Flowers, no estado norte-americano de Washington. A proprietária da loja foi processada pelo procurador-geral sob a alegação de discriminação, pois ela teria agido de acordo com sua fé cristã, recusando-se a usar suas habilidades criativas para embelezar a cerimônia de casamento de um casal homoafetivo. Mesmo sendo cliente habitual, o casal teria sido surpreendido com a informação de que, por motivos que envolviam a fé e a crença da proprietária, esta teria declinado do serviço, recomendando outras floriculturas.

O caso recebeu atenção da mídia, especialmente pelo fato de uma corte do estado de Washington ter decidido que, embora a Primeira Emenda à Constituição dos Estados Unidos defenda a liberdade de crença, isso não significa necessariamente que ela proteja e justifique as ações baseadas nestas crenças.

A temática traz à tona diversas questões envolvendo a liberdade de crença, a não discriminação e o elemento mortal da livre iniciativa, cânone da liberdade econômica. E, num diálogo constitucional, pode-se aduzir que a liberdade econômica é uma condição indispensável para todas as outras liberdades e, juntamente com a livre iniciativa, uma consequência da liberdade pessoal. Contudo, esta não está dissociada das outras liberdades como a liberdade de crença, entendendo-se por liberdade a independência da vontade arbitrária de outros, ou seja, liberdade perante a lei.

A própria sociedade deve buscar seu papel mediador, cabendo aos atores sociais abrir certas concessões em nome da paz social

Não há como negar que o mundo pós-moderno caracteriza-se pela diversidade, mas, ao mesmo tempo em que desenvolvemos novos direitos e tecnologias, chega a ser contraditório reconhecer que não desenvolvemos a capacidade de conviver de forma tolerante e harmoniosa com as diferenças, em uma afronta à própria ideia de liberdade. São abundantes as situações de conflito envolvendo a liberdade religiosa, como, por exemplo, a recusa pautada na fé de receber cuidados médicos que correspondam ao dever do Estado de tutelar a vida e a saúde pública, os feriados religiosos em face do direito fundamental à igualdade de terceiro etc.

Em que pese a real dificuldade em se resolver casos que envolvam conflitos entre os direitos fundamentais, em nosso sistema predomina a ideia da relatividade desses direitos, de modo que, sempre que possível, deve-se buscar observar os direitos envolvidos sem exaurir completamente um deles.

Muito mais do que recorrer ao Estado para a solução de todos os conflitos da sociedade, dentro de um ambiente de respeito e tolerância, a própria sociedade deve buscar seu papel mediador, cabendo aos atores sociais abrir certas concessões em nome da paz social, sendo que, no caso em comento, restou claro que a proprietária da floricultura indicou outros estabelecimentos comerciais qualificados a prestar o serviço, demonstrando seu zelo e preocupação com os clientes.

Assim, em um mundo plural e multicultural, os costumes e os valores morais somente se desenvolverão plenamente em um ambiente de respeito às liberdades, devendo estas ser consideradas em todas as suas esferas.

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.