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| Foto: Nelson Almeida/AFP

Em tempos de pesquisas de intenção de voto, abre-se também a temporada de interpretações de resultados sobre o futuro eleitoral do Brasil. As últimas pesquisas eleitorais têm mostrado liderança de Lula sobre qualquer candidato presidencial, seja em um cenário de primeiro ou segundo turno. A prisão do ex-presidente gerou espólios para sua candidatura, mas não foi empecilho para que ele aparecesse em destaque nas últimas pesquisas. Tanto nas pesquisas estimuladas como nas espontâneas, o que se vê é um domínio do candidato do PT. Uma situação nunca vista – afinal, o ex-presidente Lula permanece preso para o cumprimento de pena em Curitiba, sem perspectiva de liberdade; apesar disso, é líder absoluto das pesquisas, bem distante do segundo colocado, Jair Bolsonaro (PSL).

Estamos diante de um quadro eleitoral nunca visto, um candidato que tende à inelegibilidade liderando as pesquisas, e o segundo colocado com uma rede de apoios partidários pouco usual para uma política de presidencialismo de coalizão.

Apesar da liderança de Lula, a declaração da inelegibilidade de sua candidatura deverá ser feita pelo ministro Luís Roberto Barroso, no TSE, até 17 de setembro. Diante dessa hipótese teremos um quadro eleitoral em que seu vice, Fernando Haddad (PT), tende a assumir a chapa, com Manuela D’Ávila (PCdoB) como vice.

Sem a figura de Lula a candidatura de Haddad perde o apelo

A chapa nessa composição parece razoável eleitoralmente, com um candidato que tem experiência política, nome conhecido dentro do partido, juntamente com uma liderança jovem e também conhecida dentro do PCdoB, aliado histórico do Partido dos Trabalhadores. Porém, atualmente, a candidatura não pertence a eles, mas a Lula, que até segunda ordem não pode fazer campanha, comícios, discursos, apreciações e participação em debates.

Como vice, Haddad não pode assumir o papel do presidenciável Lula naqueles eventos de que outros candidatos participam, ponto negativo para a candidatura do PT. Entretanto, sem a figura de Lula a candidatura de Haddad perde o apelo, fazendo dele mais um dos “presidenciáveis de um dígito”, sumindo na multidão. Mesmo tendo uma história dentro do PT, seu nome não é consenso no partido, e aparentemente ele foi escolhido muito mais por ser uma pessoa de confiança do ex-presidente do que por uma deliberação conclusiva do PT. Haddad tem suas qualidades, mas não são as qualidades que possam substituir a figura de Lula.

Lula provou, em duas campanhas eleitorais, que tem capacidade de transferência de votos: conseguiu transformar Dilma Rousseff, uma ministra desconhecida e com desempenho eleitoral pífio, na presidente do Brasil por duas oportunidades. Mas, no caso de Haddad, Lula não terá tanta facilidade. Além disso, pesam sobre Lula uma condenação penal e uma rejeição eleitoral tão grande quanto seus porcentuais de intenção de voto.

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A chapa Haddad-Manuela não tem força política para vencer uma eleição majoritária nacional sozinha, ainda mais nos novos moldes de uma eleição “tiro curto” de apenas 45 dias. O PT sabe que sem Lula é impossível, e mesmo com Lula o resultado se torna difícil. A tática será esticar a campanha, passando a impressão de que Lula será candidato até o último minuto, e torcendo para que a inelegibilidade dele não venha a ser declarada antes de 31 de agosto, primeiro dia de campanha nacional de rádio e televisão, em que o candidato Lula poderá aparecer como cabeça de chapa em rede nacional.

Atingir a população com um imprevisível e arrebatador programa de rádio e televisão é o que o PT quer. E nem precisa ser uma campanha muito longa: apenas uma ou duas semanas serão suficientes para que o eleitor possa ligar as figuras de Lula, Haddad e Manuela, em uma retomada do Triunvirato da República Romana. O mais curioso é que o PT sabe que Lula será declarado inelegível, mas torce para que essa declaração venha no momento correto, possibilitando a ligação com Haddad e Manuela e livrando a chapa de ter de arrastar o corpo de Lula durante toda a campanha eleitoral.

A política tradicional foi pega de surpresa por Bolsonaro e por Lula

A não participação de Haddad nos debates eleitorais e em eventos de que os demais candidatos participam está sendo benéfica para sua candidatura; afinal, os presidenciáveis não tocam no nome de Lula, tornando sua campanha mitológica. Haddad e o PT querem isso: afinal, pelo atual quadro, para ir para o segundo turno, Haddad precisará de pouco mais de 20% do eleitorado, e o PT acredita que a transferência de votos de Lula será capaz de alcançar esse porcentual, pelo menos em tese.

Pensando em estratégia eleitoral, a jogada é arriscada, mas pode surtir efeitos para o PT; afinal, estamos dentro de uma campanha com um número grande de candidatos, e que tende ao segundo turno. É muito possível que o primeiro e segundo colocados irão para o segundo turno com um porcentual de votos próximo a 20%. Bolsonaro, surpreendentemente, tem se consolidado como um candidato que tende a estar no segundo turno, pois é o único que mantém uma curva ascendente e constante nas pesquisas eleitorais, enquanto os demais candidatos não têm conseguido desempenhar a contento para fazer frente à sua figura.

O que mais surpreende nessa eleição é que a política tradicional, os grandes partidos e as grandes coalizões foram pegos de surpresa pelo folclórico e nanico Bolsonaro e pelo histórico e condenado Lula, em uma campanha que terá toques de suspense até o último minuto. Bom para o Brasil? Com toda a certeza não, mas, que a campanha será emocionante, isso ninguém pode negar.

Francis Augusto Goes Ricken, mestre em Ciência Política e advogado, é professor do curso de Direito da Universidade Positivo (UP).
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