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No dia 9, Dia Internacional de Combate à Corrupção, a ONU, pelo escritório no Brasil, homenageou Adilson Luiz da Cruz. O taxista paulista encontrou em seu veículo 40 ingressos da Copa. Eram itens disputadíssimos, mas ele os devolveu aos donos, o que o levou às manchetes. Alguns dirão que isso não deveria ser causa para premiação, pois a atitude reflete apenas o que se espera de cada pessoa: honestidade e caráter, virtudes essenciais ao homem de bem. Mas, em tempos de mensalões e lava jatos, esse bom exemplo deve ser lembrado pelo efeito pedagógico. Ao agradecer, Adilson deixou uma lição: mais vale um real suado do que cem roubados.

A frase deve servir como reflexão para boa parte dos envolvidos na Operação Lava Jato, que promete abalar as estruturas da corrupção e do meio político brasileiro. É possível que existam inocentes. Aliás, todos gozam da presunção de inocência e do fundamental direito à ampla defesa. Acontece que, neste caso, muitos dos envolvidos já admitiram sua culpa. Existem até os que, rompendo a "ética" do submundo, a omertá da máfia italiana, estão revelando fatos que indicam a existência de uma poderosa organização que se locupletou com a troca de favores a partidos políticos e com aqueles que detêm poder de decisão.

No Congresso, como era de se esperar, a CPMI deu em nada, mas no Judiciário deve ser diferente, a começar pela participação do juiz Sérgio Moro. Severíssimo e competente, ele poderá ditar os rumos de uma revolução no combate à corrupção brasileira. Na última quinta-feira, mostrando rigor, o MP ofereceu denúncias contra 36 pessoas (algumas dessas denúncias já foram aceitas por Moro), cumprindo o que prometera o procurador-geral da República, que também já havia solicitado o afastamento de toda a diretoria da Petrobras. Isto é sintomático, partindo do pressuposto de que ele está muito bem informado. E ele afirma que irá até o fim na busca dos culpados.

Diante das dezenas de escândalos que atingiram o país nas últimas décadas, o brasileiro sabe que está vendo apenas a ponta do iceberg. Os delatores do esquema já adiantaram que as práticas ilícitas espalham-se por quase todas as obras públicas brasileiras e envolvem dezenas de políticos com foro privilegiado no STF .

A Petrobras, que deveria estar na vitrine, como exemplo de empresa pública, passou a ser vidraça. Até o seu lema poderia ser mudado: sai "o petróleo é nosso", entra "a corrupção é nossa". A empresa perdeu mais da metade do seu valor e as suas ações estão em queda livre na bolsa de valores, tanto aqui como em Nova York, onde também sofre com a proposição de uma class action – e outras virão.

As instituições que nos são mais caras, como a OAB, pela sua credencial histórica, devem ficar atentas para os reflexos dessa situação. Afinal, se ocorreram doações a partidos, com recursos de origem ilícita, as consequências podem estar no desequilíbrio de forças que a prática ilegal gerou, alterando o jogo democrático das eleições. Isso mostra que há uma premente necessidade de reforma política, que deve ser submetida a amplo debate. Particularmente, só vejo possibilidade de reformas em partes, iniciando pelo fim das contribuições de empresas nas campanhas políticas e criminalizando o uso do caixa 2, como primeira resposta imediata.

É provável que a lição de Adilson não sensibilize pessoas que gostam de levar vantagem em tudo, mesmo que seja necessário subornar ou corromper. E aí vem a questão fundamental: sem a consolidação da ética e o fim da impunidade no Brasil, não deixaremos o amargo 69.º lugar no ranking mundial de percepção da corrupção. Continuaremos a ser aquele país, como dizem, em que se paga propina até para colocar um paralelepípedo.

José Lucio Glomb é ex-presidente da seccional Paraná OAB.

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