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O censo sintetizará uma vitrine de dados e informações, que atenderá aos propósitos de subsidiar a definição de políticas, por parte das instâncias públicas, focadas principalmente em áreas sociais prioritárias

Os resultados do Censo Demográfico de 2010, a serem divulgados a partir do mês de dezembro do corrente ano, deverão traduzir os registros, no Brasil, de dois decênios e meio de reconquista da democracia, 20 anos de abertura comercial, uma década e meia de extermínio do imposto inflacionário e de conformação de um quadro de estabilidade monetária, e de inserção comercial competitiva no maior ciclo ascendente do capitalismo internacional, depois da Segunda Guerra Mundial, vivido entre 2004 e 2008.

As estatísticas também reproduzirão os mais de dez anos de ativação de programas oficiais de transferência de renda e a pronunciada mobilidade social, evidenciada pela migração de pessoas de faixas de renda menores para as médias e as decorrentes modificações nos padrões e hábitos de consumo e condições de vida das famílias, sobretudo depois de 1994, com o resgate da noção de valor dos bens e serviços, propiciado pela gerência do real, e, por extensão, a restauração das funções clássicas da moeda: unidade de conta, reserva de valor e meio de pagamento.

Tal processo induziu uma vigorosa reengenharia de atuação das grandes companhias, sobretudo aquelas atuantes nos ramos de varejo, de forma a otimizar o potencial de mercado, formado pela necessidade de atendimento da demanda reprimida, inicialmente por bens essenciais e, sem seguida, por produtos duráveis de consumo, englobando eletrodomésticos, eletrônicos, móveis e automóveis.

O Censo demonstrará também que, em um intervalo de tempo de 40 anos, a população brasileira mais que dobrou, incorporando mais de 100 milhões de habitantes aos "90 milhões em ação" que acompanharam ao vivo a conquista do tricampeonato mundial de futebol de 1970 pelo Brasil e testemunharam o chamado "Milagre Econômico", especificamente a fase de maior crescimento e concentração de renda atravessada pelo país. O episódio de duplicação demográfica não se repetirá e o volume populacional tenderá inclusive a diminuir a partir do fim da década de 2030.

Ademais, as informações colhidas devem corroborar comportamentos estruturais de variáveis relevantes. Dentre eles sobressaem a queda acentuada dos índices de mortalidade infantil, o declínio para menos da metade dos cidadãos classificados como brancos no conjunto da população, o alcance do patamar de um terço do total pela população com menos de 18 anos de idade e a redução da taxa de fecundidade para menos de 2 filhos por mulher. Essa constatação anularia a projeção de 1,85, a ser alcançada em 2043, ancorada nos dados do Censo de 2000.

Aliás, o recuo da fecundidade lidera a lista dos ingredientes da alteração do perfil demográfico do país, centrada no encolhimento relativo e, a partir de 2010, absoluto, da presença de crianças e jovens no contingente populacional. A compressão do volume de dependentes por família deve produzir o chamado bônus demográfico, caracterizado pelo predomínio dos adultos economicamente ativos na pirâmide etária, engrossado pela maior presença das mulheres na oferta de mão de obra.

Esse benefício pode ensejar a expansão sustentada do aparelho de produção e de negócios, via impulsão da renda domiciliar média e da capacidade de consumo e de poupança, no transcorrer de no máximo quatro décadas. Isso porque tal evento deve ser gradualmente neutralizado pela ampliação do contigente de idosos, em face da elevação da expectativa e da qualidade de vida, sustentados por número menor de População Economicamente Ativa (PEA).

Inquestionavelmente, o censo sintetizará uma vitrine de dados e informações, que atenderá aos propósitos de subsidiar a definição de políticas, por parte das instâncias públicas, focadas principalmente em áreas sociais prioritárias. Incorporará ainda o balizamento das cotas para o rateio dos recursos dos Fundos de Participação (estados e municípios), definidas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), do repasse das verbas federais, da dotação orçamentária de determinados ministérios e da representação parlamentar dos entes subnacionais.

Para os demais atores, a magnitude demográfica e os itens subjacentes, exibidos pelo recenseamento, servirão para dimensionar o poder específico de interferência na formulação de programas públicos, conforme a participação no conflito distributivo. Igualmente, facilitarão, para as organizações empresariais, a concepção e execução de estratégias pulverizadas de ocupação dos diferentes mercados, nos ramos da indústria, comércio e serviços, especialmente quanto às decisões de investimentos.

Gilmar Mendes Lourenço, economista, é coordenador do Curso de Economia da FAE e autor do livro Conjuntura Econômica: Modelo de Compreensão para Executivos.

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