• Carregando...

Finalmente, está criada a Defensoria Pública do Estado do Paraná. Não obstante, muitos obs­­­táculos hão de ser superados e a sanção da Lei Complementar é apenas um dos passos iniciais

A Defensoria Pública, que ao lado do Ministério Público e da advocacia é uma das funções essenciais à Justiça, tem sido objeto de constantes discussões no cenário nacional ultimamente. Felizmente, a sociedade parece estar percebendo o imenso e potencial papel que a Defensoria pode exercer para que, em suma, sejam atingidos os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, estampados na Constituição de 1988: construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Sem embargo das severas dificuldades ainda presentes no âmbito das defensorias públicas já existentes, a começar pela insuficiência de estrutura mínima de trabalho, fato é que a cada ano tais instituições têm se tornado mais capazes de cumprir seus deveres na assistência jurídica integral e gratuita dos necessitados. A cada ano, pouco a pouco, novas sedes ou unidades são abertas, novos servidores contratados ou concursados ingressam no quadro de apoio, novos defensores são aprovados em concurso público, mais pessoas, portanto, têm acesso ao serviço.

Netes ano tivemos um evento memorável: finalmente, está criada a Defensoria Pública do Estado do Paraná. Não obstante, muitos obstáculos hão de ser superados e a sanção da Lei Complementar é apenas um dos passos iniciais, mas um passo fundamental.

A expansão e fortalecimento das defensorias públicas no Brasil não têm sido fáceis. Tudo o que se tem é resultado das batalhas travadas por membros da sociedade civil, por defensores públicos, por servidores, por membros do Poder Judiciário, do Ministério Público, do Poder Legislativo, do Poder Executivo, por autoridades policiais, dentre outros, contra todos que se opõem, de alguma forma, à estruturação e desenvolvimento dos trabalhos das defensorias. Essas inexplicáveis resistência e falta de vontade causam ainda mais revolta quando, na prática diária da função de defensora pública, é possível perceber como a instituição é um fundamental instrumento de concretização dos direitos fundamentais do cidadão brasileiro. Pessoas que precisam do auxílio do defensor para regularizar a sua condição de brasileiro, para obter registro de nascimento, para conseguir um benefício previdenciário, para não ser submetido a uma custódia cautelar indevida, dentre outras tantas demandas.

De qualquer sorte, a compreensão de tudo o que significam as defensorias públicas no Brasil passa por discussões relacionadas à ética. Em tempos de intensas discussões sobre moral e ética no mundo contemporâneo, consoante afirma Zygmunt Bauman, "O falecimento dos universais e absolutos potencializados pelo poder tornou as responsabilidades do ator mais profundas e certamente mais significativas que nunca" . No entanto, "As escolhas entre o bem e o mal ainda podem ser feitas; desta vez, porém, em plena luz do dia e com pleno conhecimento de que ela foi feita. [...] Com o poder de escolha vem a responsabilidade. Se a escolha é inevitável, a responsabilidade é incontornável."

Pois bem. Em tempos em que os encontros entre os homens, conforme ensina o mesmo autor, são não raros fragmentados e episódicos, sem vínculos, sem ligações, em que a integração se resume em estar-ao-lado, chama atenção quando algo diferente acontece, quando o encontro se dá de forma plena e contínua, com estabelecimento de vínculos fundados na preservação do outro, quando a relação se estabelece na forma ser-para: eis a integração que se dá entre todos aqueles envolvidos verdadeiramente com a causa das defensorias públicas e os que delas necessitam.

Este ano, merecem especial menção todos aqueles que lutaram bravamente pela Defensoria Pública do Paraná. Aqueles que não se contiveram diante das inúmeras dificuldades, por vezes traduzidas em ameaças nem sempre veladas, que não mediram esforços para que o primeiro passo fosse dado rumo à implantação da Instituição no estado.

É certo que muito mais está por vir. Todos aqueles dispostos a ser-para os demais vivem para o futuro, como ensina Bauman. As tarefas nunca estarão cumpridas, nunca estarão terminadas. Sempre há o que buscar.

Érica de Oliveira Hartmann, defensora pública federal em Londrina, é mestre e doutora em Direito Processual Penal pela Universidade Federal do Paraná.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]