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O Natal está chegando e com ele a idéia do fim de mais um ano, de mais uma etapa concluída e dos objetivos alcançados.

Quando esta festa se aproxima, a rotina das pessoas e das cidades se altera numa grande efervescência que acaba na noite de Natal. Compras de presentes, trânsito, jantares e almoços de Final de Ano, viagens, férias, réveillon, impõem às pessoas um ritmo diferente que, somado à rotina, pode gerar um estresse que, para alguns, é até sentido como positivo, mas para outros representa um pesadelo.

Não é raro ouvirmos comentários negativos dos preparativos do Natal e de suas representações na época do ano onde tudo é correria, desgaste, expectativa e afeto. Uma data desse porte remete todas as pessoas as suas lembranças mais antigas e recria uma atmosfera, que pode ser recheada de recordações boas ou não.

Se o que temos para lembrar é bom, tudo vai ser vivido com magia e comoção. Preparar a casa, comprar os presentes, juntar os familiares, cumprimentar amigos, encantar as crianças e escolher o cardápio são ações que somam alegria e contentamento e vão deixar lembranças felizes.

Se as lembranças do passado são ruins, tudo assume uma cor de obrigação, de tarefa e protocolo. Sim, nossas lembranças norteiam parte de nossas ações e são o gatilho, muitas vezes, para o que fazemos e como sentimos. Fatos negativos associados a datas comemorativas podem gerar comprometimentos emocionais que vão limitar e distorcer as circunstâncias, tais como fobias, pânico, medo e ansiedade. A data deixa de representar o fato comemorativo para representar a história daquele indivíduo e suas emoções.

Dessa forma, o indivíduo revive na festividade sua situação traumática e tende a evitá-la de qualquer forma. Além disso, o Natal representa a aproximação do Fim de Ano que, por ser um marco de término de um ciclo, para muitos é o momento ideal para avaliar conquistas e planejar os próximos desafios. Para aqueles que conseguiram realizar seus desejos, mesmo que em parte, com certeza se aproxima um bom Natal e um Ano Novo Próspero, mas para aqueles que os desejos e objetivos não foram realizados ou não saíram a contento se aproxima mais um momento de confrontação com seu fracasso e frustração, o que é difícil de comemorar.

Outros sentem o Natal como algo triste, melancólico e preferem se isolar procurando refúgios onde se sintam livres das obrigações sociais que a data impõe. Para estes, não ocorreu nada traumático que justificasse, a desilusão. Essa desilusão, na realidade, começou há muito tempo, talvez por um excesso de expectativa, talvez porque cansaram de esperar por coisas que acabaram percebendo que nunca teriam. Isso nada tem a ver com desejos materiais, mas com sonhos, sentimentos e necessidades guardadas a sete chaves dentro do coração.

O Natal representa para todos união e muitos não têm a quem se unir ou por que se unir. Famílias problemáticas, desfeitas ou que estão atravessando momentos muito difíceis podem transformar uma data como essa em um verdadeiro campo de guerra, onde se medem força e prestígio. Nestas famílias, até a negociação de onde vão se reunir para festejar o Natal é uma operação complicada que leva meses e o resultado ainda pode não ser bom.

Em condições emocionais desfavoráveis e se sentndo "obrigado" a estar bem, o indivíduo pode experimentar sentimentos como angústia, tristeza e depressão que podem levá-lo a um quadro de comprometimento emocional importante que merece atenção. É sabido que circunstâncias ou datas de grande apelo afetivo podem intensificar comprometimentos emocionais e doenças já existentes levando a uma crise por conta do estresse que essa comoção provoca.

Parece incrível como uma data tão festiva e cheia de magia pode representar dor e sofrimento. Quando temos nossa família e o que encontramos dentro de casa é paz e sossego durante o ano, sabemos bem o que vamos encontrar na reunião em volta do Natal, pois provavelmente a disposição das pessoas não será diferente. Mas, quando nossa família passou por problemas durante o ano ou se temos uma família muito numerosa, e com isso muitos a contentar, essa reunião merece acordos que, muitas vezes, as pessoas não estão dispostas a fazer.

Nesse ponto, toda cautela é pouco, pois não é raro que a atmosfera de Natal não consiga deter que os ânimos negativos e as discussões do dia-a-dia se repitam nesta noite. Talvez seja interessante negociar com todos uma trégua e medir a disposição das pessoas para este evento, pois ter que suportar o Natal não é uma boa idéia.

Muitas famílias não se encontram durante o ano e utilizam o Natal para se verem e colocar o assunto em dia. Aquele primo distante, a tia chata, o cunhado que bebe demais e vive falando besteira existem em todas as famílias e saber que eles só estarão conosco nesse dia e depois irão embora é um alento que nos disponibiliza a recebê-los, pois estamos todos juntos novamente e é isso que importa. Na verdade, para comemorar ou mesmo conviver, são necessárias certas concessões que viabilizam a convivência e possibilitam grandes momentos.

Um grande Natal talvez não seja aquele dos sonhos, cheio de presentes caros na casa maravilhosa, cercado de gente linda, mas aquele possível, tão legal quanto da revista que tem exatamente a nossa cara e o nosso tamanho. Aquele que acontece em nossa casa, com a comida que podemos oferecer, com o doce da avó ou tia que sempre é muito bom, com a roupa confortável, o sorriso franco, com presentes que mostram muito mais atenção e carinho do que poder e dinheiro.

O Natal é uma festa de união, onde podemos renovar nossos votos de amor a nós e a todos que estimamos e é isso que devemos priorizar.

Não nos livramos magicamente das nossas mazelas para viver o Natal, mas podemos abrir um espaço para refletir, descansar e renovar nossas forças contaminadas por esta festa de amor e união.

Feliz Natal a todos!

Silvana Martani é psicóloga da Clínica de Endocrinologia da Beneficência Portuguesa de São Paulo.

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