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Imagem ilustrativa.| Foto: Site da Prefeitura de Fortaleza

A educação no Brasil hoje chegou num impasse, com milhões de jovens concluindo a educação fundamental sem saber aplicar um conceito de matemática ou interpretar um texto simples; com o ensino médio estagnado e com altíssimas taxas de abandono; com um ensino superior público caro, desigual e que não consegue atender a mais do que 25% das matrículas; e um sistema de pós-graduação e pesquisa em grande parte voltado para si mesmo, que cresceu em quantidade, mas não em impacto e relevância científica  econômica-social, descontadas as boas exceções de sempre.

Mas precisamos afastar a impressão de que estamos diante de uma missão impossível pois volta e meia ouvimos falar de bons exemplos de locais que promoveram revoluções na educação em relativo pouco tempo. E conosco também pode ser assim. A educação no Brasil, pode, sim, melhorar.

No Brasil a sala de aula representa um verdadeiro “buraco negro” e, salvo algumas exceções, no geral, ninguém sabe o que os professores estão ensinando em classe.

Tomemos o exemplo da Ásia, e em especial a China, que brilha continuamente no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) publicado a cada três anos pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Quatro metrópoles e províncias chinesas (Pequim, Xangai, Jiangsu, Zhejiang) lideram o ranking entre os locais mais bem-educados do mundo em leitura, ciência e matemática.

O que fazem de excepcional para chegar lá? Seus governos instalaram um sistema educacional com ênfase no treinamento e valorização dos docentes através de incentivos por produtividade. Em Xangai, que é a maior cidade do país em população, 30% da renda do professor pode ser formada por pagamentos de bônus adicionais ao salário base. Espera-se ainda que professores que exercem cargos de direção em escolas continuem ensinando, e parte de seus salários se vincula ao desempenho das instituições.

Outro ponto importante é que os professores têm seu tempo de atividades extraclasse dentro da escola (e não fora dela, como em muitas escolas brasileiras), corrigindo tarefas escolares e preparando planos de aula minuciosos e em colaboração com os colegas. Observam, também, as aulas dos outros professores e juntos discutem o que pode ser aperfeiçoado dentro dos limites dos recursos que dispõem. Aqui no Brasil a sala de aula representa um verdadeiro “buraco negro” e, salvo algumas exceções, no geral, ninguém sabe o que os professores estão ensinando em classe.

Hoje, cerca de 42,6 milhões de brasileiros estão matriculados em algum tipo de escola, sendo mais de 80% em escolas públicas, atendidos por um exército de mais de 3,2 milhões de pessoas, entre professores, dirigentes escolares, funcionários e outros profissionais. A estimativa mais recente de que o Brasil gaste algo em torno de 5,6% do PIB em educação, incluindo os gastos privados. É inquestionavelmente alto o valor e desmistifica aquele discurso de que o país investe pouco em educação.

E daí surge outro ponto a se questionar. Esse esforço concentrado na educação não deveria ser suficiente para oxigenar o nosso mercado? De fato, as pessoas mais educadas ganham mais, supostamente porque têm competências que o mercado de trabalho valoriza, e países em que a população é mais educada são mais desenvolvidos. No entanto, no Brasil a produtividade manteve-se estagnada ao longo das últimas décadas. Uma das razões é que a educação cresceu dando prioridade às demandas por credenciais – diplomas – e às reivindicações corporativas do setor, em detrimento da ênfase no mérito e nas competências. Como vários estudos recentes têm demonstrado, não basta aumentar a escolaridade para que a produtividade aumente. É preciso que a educação seja de qualidade, o que não tem ocorrido de forma satisfatória por aqui.

No Brasil, existe uma cultura de que ensino superior é sinônimo de universidade. Criou-se esse mito de que todo mundo precisa ser doutor e que curso técnico profissionalizante é algo menor, degradante. O país precisa oferecer cursos diferenciados para populações diferenciadas. Tem gente que quer aprender sobre as coisas e tem gente que quer aprender a fazer coisas.

O nosso país tem que decidir se quer colocar todo mundo na universidade ou se quer criar um ensino superior que ofereça condições para dar à maioria da população a condição para continuar os estudos depois do ensino médio, aprender uma profissão, se inserir no mercado de trabalho e exercer uma cidadania responsável. Mas a gente não vê nenhum agente público discutindo isso. Só vemos as pessoas querendo sair bem na foto dizendo que vão colocar mais meia dúzia de estudantes nas universidades federais e estaduais. E achando que com isso vão resolver o problema da nossa educação.

É preciso construir um novo consenso baseado na ideia de que deve ser possível fazer muito mais com os 5,6% do PIB que o Brasil já gasta em educação. Com a queda da natalidade, serão menos estudantes e será possível ter menos professores e remunerá-los mais satisfatoriamente. O trabalho docente precisa ser reformado, com melhores cursos de formação, carreiras associadas ao desempenho e facilitando o acesso ao ensino de pessoas com outros perfis.

É chegada a hora de repensar isso tudo.

Leonardo Siqueira, economista e mestre em economia pela Universidade Pompeu Fabra (Espanha), é fundador e editor-chefe do portal de economia política Terraço Econômico.

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