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Esgota-se em fevereiro, no dia 14, o prazo fixado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que os tribunais de Justiça do país acabem com a prática do nepotismo, anulando a contratação, em cargos de confiança, de parentes de juízes e desembargadores até o terceiro grau. Vivemos um momento propício para discutir ética e sua relação com o nepotismo, uma verdadeira praga grudada na história dos três poderes no Brasil e esparramada do Oiapoque ao Chuí.

De início, faço minhas as palavras do presidente da OAB/PR, Manoel Antônio de Oliveira Franco: "O nepotismo, em qualquer esfera de poder, precisa ser combatido. O que vemos são cargos públicos sendo usados como moeda de troca. A sociedade brasileira não tolera mais o favorecimento ilícito que provoca a falência do sistema político". É preciso recordar que este costume, abominável, começou ainda na Era do Renascimento, praticado pelos papas, que procuravam colocar seus sobrinhos (o termo vem do Latim – "nepot" –, que se refere a sobrinho) nas esferas da burocracia eclesiástica, independentemente de serem ou não profissionalmente qualificados. Aos poucos, essa prática foi estendida aos demais parentes.

Atualmente, no Brasil, ao mesmo tempo em que ataca-se o nepotismo, altos escalões dos três poderes o defendem. Recentemente, por exemplo, o ex e o atual presidente da Câmara Federal, deputados Severino Cavalcanti e Aldo Rebelo, saíram em defesa veemente desta prática. Na Câmara Federal, a última informação é a de que há 96 esposas (os) contratadas (os) pelos deputados, além de filhos e outros parentes. A Câmara tem hoje cerca de 2,5 mil Cargos de Natureza Especial (CNEs), ocupados por pessoas que recebem de R$ 2,4 mil a R$ 6,2 mil. Dessas, 1.650 estão lotadas em comissões permanentes e temporárias da Casa. Dos outros ocupantes de CNEs, 196 fazem serviço administrativo e 165 servem a Mesa Diretora. Trezentos e 86 cargos são distribuídos proporcionalmente entre as bancadas dos partidos. Não é pouco. Segundo o presidente da Associação Nacional de Magistrados Estaduais (Anamaes), Elpídio Donizetti, o presidente Lula tem mais de 25 mil cargos de confiança. Não é pouco.

O PCdoB (partido de Aldo Rebelo) divulgou nota, publicada pelo jornal "O Estado de S. Paulo", defendendo a nomeação de dirigentes partidários para o gabinete de sua liderança na Câmara. O jornal paulistano apontou 21 pessoas lotadas sob a rubrica CNEs neste gabinete, muitas delas militantes do partido. Entre os nomeados, estão Rita de Cássia Polli Rebelo, mulher de Aldo, e Apolinário Rebelo, irmão do presidente da Câmara.

Não são poucos os que defendem essa prática com razões diversas, quase sempre insustentáveis. E isto, infelizmente, não é um privilégio dos altos escalões da República. Mas viceja também no legislativo estadual e municipal, como também nos poderes executivo e judiciário. E, inclusive, na iniciativa privada. Mas, há um detalhe: a iniciativa privada não paga seus funcionários com o dinheiro público. Seu lucro, maior ou menor, depende de sua eficiência administrativa e não de cargos e do erário públicos. Está provada a demanda exagerada de números superlativos de funcionários nos gabinetes públicos, aumentando as despesas, sem, na maioria dos casos, haver melhora de eficiência.

Por tudo isto, há inclusive quem defenda, em termos mais radicais, que o nepotismo é tão imoral que os deputados (federais e estaduais) e vereadores que o praticam deveriam ser cassados por abuso de poder, estejam os apaniguados em seus gabinetes, de seus pares (no que se chama de "nepotismo cruzado") ou em empresas estatais. É preciso, em planos mais reais, já que os parlamentares dificilmente votarão contra seus próprios interesses, cumprir, pois, com o veto ao nepotismo a partir da principal ação do Conselho Nacional de Justiça em seus primeiros meses de funcionamento. O exemplo pode começar no Judiciário, apesar de inexplicáveis reações de setores do próprio setor contestando a medida moralizadora, com manifestações que vão desde a pregação da desobediência civil até a resistência através de medidas judiciais. Parece incrível, absurdo, mas não é.

Na Assembléia Legislativa do Paraná, os deputados Ratinho Jr. (PPS) e Tadeu Veneri (PT) apresentaram, no final do ano passado, propostas para minar o nepotismo no estado. O primeiro abriu mão de um projeto de lei em função de uma emenda constitucional apresentada por Veneri, em outubro, com a observação de ser votada em regime de urgência. Espero que, com a volta dos parlamentares aos seus trabalhos, em fevereiro, a emenda possa ser uma das primeiras a ser analisada na Assembléia. Pode ser um ótimo exemplo para o país infestado de maus exemplos em seus três poderes. À guisa de lembrança, o nepotismo é uma forma de corrupção.

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