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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, apresenta a juíza do 7.º Circuito dos Estados Unidos, Amy Coney Barrett, como nomeada para a Suprema Corte no Rose Garden na Casa Branca em 26 de setembro de 2020, em Washington, D.C.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, apresenta a juíza do 7.º Circuito dos Estados Unidos, Amy Coney Barrett, como nomeada para a Suprema Corte no Rose Garden na Casa Branca em 26 de setembro de 2020, em Washington, D.C.| Foto: Chip Somodevilla/Getty Images/AFP

O falecimento da juíza Ruth Ginsburg pode marcar o fim de uma era na Suprema Corte dos Estados Unidos. Tradicionalmente balanceada entre progressistas e conservadores, tudo indica que a corte pode perder este salutar equilíbrio, que tem servido como farol nos tempos mais difíceis. A configuração de poder única deste fim de mandato do presidente Donald Trump, que também possui maioria no Senado, pode funcionar como gatilho destes novos tempos.

A democracia exige prudência; entretanto, a oportunidade que está em jogo é muito preciosa nestes tempos polarizados. Ao aprovar um nome conservador, a corte alcança sólida maioria, com possibilidade de reverter precedentes relevantes, como aquele que autoriza o aborto. Fato é que os riscos da polarização correm dos dois lados e um dia o jogo pode se inverter.

No governo Barack Obama, após o falecimento de Antonin Scalia, o mais conservador do colegiado, o presidente democrata preferiu indicar Merrick Garland para sua vaga. Garland era considerado um centrista, e Obama acreditou que esta credencial poderia ajudá-lo no processo de confirmação; afinal, Anthony Kennedy e Clarence Thomas, indicados por Reagan, foram confirmados por um Senado de maioria democrata.

Nada disso. O vírus da polarização já havia contaminado o Senado e as antigas agendas bipartidárias, tão populares no passado, foram esquecidas. Os republicanos, no controle do Senado, impuseram uma derrota a Obama. O Comitê Judiciário do Senado não realizou audiências de confirmação com Merrick Garland e sua indicação caducou com o fim do ano legislativo.

Hoje, o jogo se virou contra os democratas. Os republicanos entendem que, se Obama indicou o substituto de Scalia, Trump tem o direito de indicar o substituto de Ginsburg. Sem surpresas. Mas fato é que novamente os republicanos estão com o controle do Senado, e desta vez com votos suficientes para aprovar o nome indicado. A aprovação tende a ser expressa, terminando todo o processo antes do fim da corrida eleitoral.

Ao indicar Amy Coney Barrett, Trump escolheu aquela que foi a mais dedicada assistente de Antonin Scalia em seus anos na Suprema Corte. Um nome muito alinhado com os conservadores e com os outros dois juízes que ele indicou ainda neste governo: Neil Gorsuch e Brett Kavanaugh. Aos poucos, Trump, em seu primeiro mandato, terá conseguido realizar a maior guinada conservadora da corte em décadas.

Os riscos, entretanto, são grandes. Assim como os democratas acreditaram que seria possível jogar pesado com as regras do Senado quando tinham maioria, o movimento pendular da política foi cruel quando estavam mais fracos.

Os republicanos tinham a grande chance de mudar este estado de coisas, firmando um precedente quando possuem maioria: esperar o resultado eleitoral. Isto foi realizado em 2016 em outra configuração, mas este seria o momento de mostrar que suas virtudes democráticas podem falar mais alto do que a simples oportunidade política.

Mas, ao fim e ao cabo, estamos falando da terrível batalha de poder pelo controle do Judiciário mais influente do mundo. E, em tempos de polarização, ninguém quer perder a chance de crescer sobre seu oponente. O caminho do meio de Washington nunca esteve tão longe no horizonte e esta não é uma boa notícia para a política. O fim de uma era de entendimento e equilíbrio pode ter chegado ao Judiciário.

Márcio Coimbra, cientista político e mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos, é coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, ex-diretor da Apex-Brasil e diretor-executivo do Interlegis no Senado Federal.

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