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Quando uma empresa subsidiada pelo BNDES quebra, quem acaba ficando com a conta são os consu­­midores. É o socialismo invertido, em que o lucro é privatizado e os prejuízos socializados

Apoiar a fusão entre Carrefour e Pão de Acúcar pode vir a ser a mais nova missão do BNDES. Enquanto burocratas e empresários discutem os detalhes de como proceder com a criação do "Carreçúcar", uma questão relacionada deveria preocupar analistas políticos e econômicos: por que o dinheiro público deve ser utilizado para financiar fusões de interesse privado?

Luciano Coutinho, presidente do BNDES, justifica as práticas do banco no modelo desenvolvimentista de planejamento econômico. Em entrevista de 2009, Coutinho disse que "o Brasil precisa ter campeãs mundiais". Nessa corrida pelo desenvolvimento, o BNDES teria papel relevante. "É absolutamente natural que, na expansão dessas empresas, o BNDES, em condições de mercado, possa apoiar essas oportunidades", completa Coutinho.

A obsessão por "campeãs mundiais" pode fazer com que se perca a noção de que campeonato estamos disputando. De fato, a "Carreçúcar" pode se tornar uma empresa campeã. Mas quando pensamos no que é mais desejável para a sociedade o título de campeão vale menos que a campanha. Em um regime de livre concorrência, ensina a velha teoria econômica, venceria a empresa que melhor atendesse às demandas dos consumidores.

É o apelo ao consumidor que AT&T e T-Mobile, duas grandes operadoras da telefonia móvel americana, usam para justificar sua fusão. Mas no modelo brasileiro de capitalismo, a vitória de uma empresa não necessariamente corresponde a sua capacidade de satisfazer a sociedade. Para facilitar a criação de uma empresa campeã, mudam-se as regras do jogo. Em vez de depender de convencer investidores privados, o BNDES oferece crédito subsidiado.

A justificativa é que o BNDES investe nos setores em que o Brasil demonstra competitividade. Mas a competitividade de um país não se planeja; se descobre. Há alguns anos, não se imaginava que um país pobre como a Índia se tornaria a grande exportadora de especialistas na tecnologia da informação. Também não se sabia que as Filipinas viriam a dominar o mercado mundial de circuitos integrados. Nem que o Chile se tornaria um grande exportador de salmão. Só podemos saber de fato em que setores o Brasil é mais competitivo, quando todos são tratados igualmente e sem privilégios.

Há ainda um problema de incentivos. Diferente de um investidor privado, o BNDES não irá à falência caso suas decisões se mostrem equivocadas. Quando uma empresa subsidiada pelo BNDES quebra, quem acaba ficando com a conta são os consumidores. É o socialismo invertido, em que o lucro é privatizado e os prejuízos socializados.

A visão econômica por trás da fusão entre Carrefour e Pão de Açúcar não é nova. É apenas uma nova manifestação da velha ideologia desenvolvimentista. E a história do século 20 atesta o seu fracasso. Do que adianta o Brasil ter empresas campeãs, quando os derrotados são os brasileiros?

Diogo Costa, mestre em Teoria Política e graduado em Direito, é professor de Economia e Relações Internacionais do Ibmec.

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