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O cartunista Benett resumiu brilhantemente o episódio da renúncia de Bento XVI. O agora papa emérito alegremente joga golfe com o báculo servindo como taco. O papa cansou de ser papa e pronto. Agora quer aproveitar seus últimos dias, meses ou anos para contemplar a natureza, meditar, rezar, ficar sozinho, tocar piano, longe de pressões, da politicalha e das crises que estava tendo de administrar.

Com aquele imediatismo que é a marca registrada dos tempos de hoje, jornalistas e analistas se apressaram em interpretar a renúncia de Bento XVI como sua derrota em face dos problemas que afetam a Igreja Católica, desde a perda de fiéis até os escândalos da pedofilia e as práticas financeiras pouco ortodoxas do Banco do Vaticano. Certamente, esses abacaxis azedaram os dias do papa, mas não creio que nenhum deles tenha o caráter cataclísmico que lhes atribuem.

Bento XVI é um homem culto e conhece a fundo a história de sua própria religião e da religião dos outros para saber que, independentemente de seu caráter transcendental, as igrejas ou quaisquer outras organizações religiosas são, no plano temporal, organizações humanas, povoadas por muitas pessoas imperfeitas ou mais que imperfeitas, capazes de praticar desde pequenas transgressões até grandes crimes. Será que a pedofilia é exclusividade de padres católicos como parece ao leitor desavisado? Não existem atos abjetos e condenáveis de pedofilia em outras religiões? Até as pedras da Via Dolorosa sabem que não é assim.

Será que a má gestão do Banco do Vaticano é uma característica singular dos banqueiros católicos? Como qualquer outro banco pertencente a luteranos, metodistas, batistas, judeus, mulçumanos, ateus, agnósticos ou pagãos, o Banco do Vaticano deve ter alguns ou muitos funcionários e executivos imprudentes, desonestos, gananciosos ou simplesmente despreparados. Não vimos os grandes e sofisticados banqueiros do mundo capitalista quase quebraram o sistema financeiro mundial há dois anos, jogando US$ 1 trilhão no ralo? E não vimos o Banco JPMorgan Chase perder US$ 6 bilhões em uma única operação de derivativos, apesar de toda a sua bateria de PhDs em matemática financeira e computadores de última geração?

Bento XVI sabe mais. Sabe que a Igreja Católica está aí há 2 mil anos e que já viveu momentos muito mais dramáticos sem perecer.

Acredito que, simplesmente, o papa Bento XVI – um ser humano frágil, que como qualquer mortal deve acordar sentindo dores de reumatismo ou o mal-estar de algo que comeu na véspera e não lhe caiu bem – não tinha mais vigor para tentar resolver esses problemas. Menos ainda para aturar cardeais e assessores a lhe exigir atenção e decisão o tempo todo: "Preciso falar um minuto com Vossa Santidade..." "Vossa Santidade vai se surpreender e não vai gostar, mas sou obrigado a dizer que...", "quando Vossa Santidade puder me conceder um minuto, tenho um assunto de alta gravidade..."

Isso é coisa para gente mais jovem e com disposição e paciência que já não tenho mais, deve ter pensado o papa. E então, em um gesto de grandeza e humildade, renunciou.

Belmiro Valverde Jobim Castor, é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

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