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A busca de um meio termo nesta briga entrincheirada re­­presenta uma posição tão simples de expor quanto imprópria

Algumas opiniões publicadas em jornais têm prestado um desserviço aos brasileiros, na complexa discussão sobre eventuais mudanças no nosso Código Florestal. Principalmente quando dizem respeito à criação de trincheiras isoladas entre os favoráveis e os contrários às reformas preconizadas. Alterações pretendidas por um setor específico da sociedade implicam flexibilizações sérias na atual legislação e um amplo afrouxamento aos que não cumpriram as regras no passado. A posição dos que defendem a manutenção e a evolução da lei atual entende que o mais adequado é a busca pelo cumprimento da legislação bastante próxima do que se cobra hoje, revertendo processos de degradação ocorridos no passado e buscando algumas possibilidades de fomento e compensação.

A dicotomia é negativa justamente pela maneira simplista com a qual é explicitada. Negar a presença do agronegócio como uma das atividades econômicas relevantes no País e a defesa da ideia de uma agricultura apenas baseada na pequena propriedade não é uma posição realista. Também carimbar toda a atividade de produção em escala como inimiga e desinteressada na conservação soa exagerado. Ressalte-se, por exemplo, a atividade de produção de papel e celulose, um negócio bastante rentável e que, muito embora mereça críticas e preocupação pelo crescimento descontrolado, procura seguir os preceitos do Código Florestal Brasileiro. Essa atividade não perde dinheiro nem está ameaçada de desaparecimento em função disto, muito pelo contrário.

Do outro lado, acusar de radicais e seguidores de ideologias retrógradas os defensores de uma lei mais rigorosa para garantir a continuidade da produção é, no mínimo, um insulto à inteligência. A busca pela manutenção da legislação que rege o uso da propriedade é séria, tem embasamento científico e deve ser respeitada ainda mais por não representar um interesse setorial diretamente voltado a resultados econômicos próprios.

Assim, a busca de um meio termo nessa briga tão entrincheirada representa uma posição tão simples de expor quanto imprópria. Áreas naturais não são um passivo para a sociedade. Não são um peso a ser carregado por quem produz. Ou um custo indesejável àquele que se propõe a explorar a terra e gerar riquezas a partir de seu trabalho. Essas são falsas verdades expostas como o maior problema a ser sol­­ucionado. Ficamos limitados ao desafio simplista de discutir como poderemos diminuir o fardo da conservação que todos produtores rurais, de maneira indesejada, necessitam carregar.

As áreas naturais que necessariamente devem compor o mosaico de diferentes usos de uma propriedade são parte intrínseca do negócio dessa unidade produtiva. E esse negócio poderá, assim, ser explorado a longo prazo, dentro de condições adequadas de produtividade, com a proteção dos recursos naturais. Fora desse contexto, estamos falando de uma expropriação de recursos que pertencem à sociedade em prol de resultados econômicos de curto prazo para um setor específico. Dessa maneira, no final, todos perdem.

O que ainda não está em discussão suficientemente aprofundada é que as áreas naturais de cada propriedade representam uma oportunidade excepcional para a diversificação da produção. As Reservas Legais apontadas pelo Código têm possibilidades de manejo, embora ainda inconsistentes e inadequadas pela falta de boas tecnologias e suficiente controle nestas atividades. Além disto, o pagamento por serviços ambientais é hoje um conceito que se difunde velozmente em todo o mundo, remunerando proprietários de áreas naturais por serem os responsáveis pela produção de água, conservação dos solos, proteção dos rios, segurança contra acidentes naturais, equilíbrio do clima, conservação das espécies nativas. Esse é um novo negócio que surge para ser aproveitado ao máximo no apoio à viabilidade econômica da propriedade rural.

O uso do poder e de dados falseados para tentar impor uma vitória sem vencedores é o pior caminho que poderíamos escolher. A ausência de percepção da sociedade da real importância e abrangência desta discussão nos coloca nas mãos da velha e rançosa politicagem, que nos custa e custará muito caro.

Clóvis Borges é diretor-executivo da ONG Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS).

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