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O governo fluminense ainda não ex­­­plicou porque menosprezou a des­­­montagem do sistema financeiro que mantém e dá fôlego ao narcotráfico

Os cariocas aprovaram maciçamente (82%) a ação dos agentes do Estado contra o narcoterrorismo, segundo pesquisa do Ibope: competente, intensa, continuada. Pequenos foram os "danos colaterais" e publicamente denunciados os excessos policiais.

Mas está ficando evidente que a perda do território apenas não acabará com a bandidagem nas comunidades carentes. Os "soldados" do tráfico são pés de chinelo, em todos os níveis. Mesmo as mansões dos chefetes descobertas em pontos privilegiados dos morros são modestas se comparadas com as fortunas que passam pelas mãos dos chefões habilitados financeiramente para operar o grande conglomerado do crime organizado.

O tráfico internacional de armas e drogas exige escala, apoio logístico, operadores ágeis, capazes de atuar em diferentes níveis, inclusive na esfera política. O antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário nacional de Segurança Pública, vem reclamando há tempos uma atuação mais ampla e mais profunda das autoridades.

O suporte doutrinário e factual que Soares vem oferecendo através dos livros Elite da Tropa (inspiradores dos sucessos de bilheteria, Tropa de Elite), completou-se nos últimos dias com insistentes manifestações contra o maniqueísmo que reduz o problema da segurança (no Rio e no resto do país), a dois players: bandidos de bermudas e agentes da lei de uniforme. Os que usam colarinho – branco ou de outras cores – não aparecem na equação.

Esse elenco ultrassimplificado serve conjuntamente aos governantes e à mídia porque facilita ações espetaculares de grande efeito moral, sem a necessária eficácia no âmago das estruturas criminosas. O governo fluminense ainda não explicou porque menosprezou numa operação tão bem planejada militarmente a desmontagem do sistema financeiro que mantém e dá fôlego ao narcotráfico. Pensou-se em tudo, inclusive em blindados com lagartas para esmagar os obstáculos colocados pelos facínoras para impedir o acesso dos carros de assalto com rodas. Mas não se pensou em cortar a rede de circulação de dinheiro que alimenta o narcotráfico.

Nesta quinta-feira, o jornal de economia e negócios, Valor Econômico, publicou na primeira página breve e inocente informação sobre a montagem na polícia do Rio de um sofisticado sistema de rastreamento do dinheiro-bandido denominado Lab-LD (Laboratório de Tecnologia contra Lavagem de Dinheiro).

Esse sistema, segundo o jornal, teria possibilitado a prisão da companheira do traficante Polegar num apartamento de alto luxo em zona nobre do Rio. A cúmplice é fichinha, Polegar é fichinha, os graúdos do crime organizado não moram no Rio, estão em lugar seguro, vivendo nababescamente, intocados. A irrisória façanha comprova que o Lab-LD não foi plenamente usado.

Ou foi abusado. Em outras palavras: as preciosas informações foram talvez desviadas para fins escusos. Não seria a primeira vez: extorsões e chantagens fazem parte do histórico da corrupção policial. E essa não funciona isolada. Ela só existe e subsiste porque está entranhada na corrupção do Judiciário, do Legislativo e do Executivo. Em todos os níveis, inclusive o federal.

O Complexo do Alemão é mais complexo, mais arraigado e desgraçadamente mais amplo do que o logradouro da zona Norte do Rio onde no último fim de semana o crime organizado sofreu o primeiro revés.

Alberto Dines é jornalista.

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