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O Dia Mundial Sem Carro, comemorado neste domingo, teve início na década de 1990 em alguns países europeus e, a partir de 2001, passou a existir também no contexto nacional brasileiro. Com vistas à sensibilização da população, tal iniciativa tem por finalidade, sobretudo, a diminuição dos congestionamentos, a redução da emissão de gases poluentes gerada pela queima de combustíveis fósseis e o incentivo à utilização de transporte coletivo e modais não motorizados. No cerne inicial do movimento está a crença de que tal cenário pode ser condicionado pela reflexão dos motoristas que, ao menos nesse dia, experimentarão modais alternativos de deslocamento e concluirão, posteriormente, que a circulação pode ser realizada de forma satisfatória, sem a utilização do automóvel.

Analisando-se o contexto das grandes cidades brasileiras, tem-se verificado a oferta, no Dia Mundial sem Carro, de atividades de lazer, cultura e serviços que acabam por induzir, de certa forma, o questionamento da eficácia do movimento no âmbito nacional e, não obstante, da maneira com que a população tem entendido tal iniciativa. Em Curitiba, por exemplo, chamadas que relacionam o movimento à mudança da estação do ano anunciam uma programação intensa para os dias 21 e 22 de setembro de 2013: shows, ioga, bazar e brincadeiras. Nessa conjuntura de atividades, nem sempre vinculadas ao objetivo final da iniciativa mundial e em que o debate direto da mobilidade, enquanto política pública, não recebe destaque, fica difícil visualizar a real contribuição para a reflexão acerca dos malefícios desencadeados pela utilização exacerbada de modais individuais, por exemplo.

Com relação a cenários conflitantes, nota-se que, em se tratando de mobilidade, o desencontro de medidas é consideravelmente comum. A Lei n.º 12.587, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, entrou em vigor em janeiro de 2012 e tem, como uma das principais diretrizes, a prioridade dos modais não motorizados e dos serviços de transporte público coletivo. Contraditoriamente a essa postura, naquele mesmo ano o governo federal anunciou, sob o pretexto de estimular o crédito no país, a redução do IPI. Se por um lado tal medida (que se estendeu por quase todo o ano de 2012) aqueceu a economia, por outro foi responsável pelo ingresso de milhares de novos veículos, acarretando o incremento dos congestionamentos e demais danos relacionados à mobilidade insustentável – um direcionamento completamente contrário ao que propõe a política nacional.

Entre um desencontro e outro, o paradoxo está montado. As manifestações ocorridas em junho, desencadeadas pelo aumento das tarifas do transporte público, configuram, talvez, o principal exemplo de que a questão da mobilidade influencia diretamente no cotidiano da população. Não obstante, a carência de investimentos em ciclovias e transporte público de qualidade se faz presente em todos os municípios do país. Não se trata, portanto, apenas de uma questão cultural, mas também de política pública. Nesse sentido, os objetivos iniciais do Dia Mundial sem Carro poderiam ser atingidos de forma mais efetiva se tal movimento tratasse não apenas de temas comportamentais, mas também de questões da mobilidade como política setorial.

Débora Follador, doutoranda em Gestão Urbana na PUCPR, é arquiteta e urbanista da Ambiens Sociedade Cooperativa.

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