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O órgão especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em decisão irretocável, reconheceu, em ação proposta pela Defensoria Pública representando um feto, o direito da mãe, que se encontrava presa em uma cadeia pública de São Bernardo do Campo (SP), a um pré-natal adequado, para que o bem-estar do nascituro fosse assegurado. Reconheceu, portanto, ao feto legitimidade para figurar no pólo ativo da ação.

Os fundamentos jurídicos da decisão são inatacáveis. O Estatuto da Criança e do Adolescente assegura tal direito, assim como o artigo 227 da Constituição Federal.

Embora o referido artigo da Lei Suprema refira-se apenas à criança, o "caput" do artigo 5.º garante o direito à vida, e o art. 4.º do Pacto de São José, Tratado Internacional sobre direitos fundamentais do qual o Brasil é signatário, declara que a vida começa na concepção.

O Código Civil, na mesma linha, em seu artigo 2.º, determina que: "Art. 2.º: A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro".

Seria curiosíssimo que a lei civil garantisse todos os direitos do nascituro, menos o direito à vida. Creio que nem os neandertalenses, em seu primitivismo, defenderiam tal contradição.

Por outro lado, os ecologistas fizeram aprovar o Projeto Tamar, pelo qual configura crime ambiental destruir ovos de tartaruga, sendo dada toda a proteção aos filhotes. Para mim, a vida de um ser humano é, ainda, incomensuravelmente mais valiosa do que a de uma tartaruga.

O órgão especial do Tribunal de Justiça, ao assegurar ao feto, mesmo não tendo, ainda, personalidade jurídica, o acesso à Justiça para garantir pré-natal adequado, afastando eventuais maus tratos, desídia ou descaso, em virtude da condição em que se encontrava a mãe, fez valer o seu direito de nascer em segurança, impondo ao juiz de primeiro grau que apreciasse o pedido por ele formulado. Prestigiou, portanto, o mais fundamental de todos os direitos, que é o direito à vida.

Para os jusnaturalistas, que não vêem conflitos entre o direito positivo e o direito natural, há um pequeno núcleo de direitos (os naturais) que ao Estado cabe apenas reconhecer – entre eles o principal, que é o direito à vida –, cabendo-lhe a criação de todos os outros direitos (formas de governo, representação, regras econômicas etc.). E a declaração universal dos direitos fundamentais não é senão uma clara carta de direito natural.

Como se percebe, lembrando a lenda do moleiro de Frederico da Prússia, não é apenas em Berlim que existem juízes. No Brasil, também, há magníficos magistrados, como demonstrou o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo.

Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, Paulista e da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército-ECEME.

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